Negociado versus legislado abriu precedente para perda de direitos trabalhistas

Reprodução CNM/CUT
Negociado versus legislado abriu precedente para perda de direitos trabalhistas

Quarta matéria, prodozida pela CNM/CUT, sobre negociação coletiva aborda argumento jurídico que trouxe insegurança aos trabalhadores depois da Reforma Trabalhista. Veja o que pode e o que não pode ser negociado

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2 de junho do ano passado, que normas de Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho podem limitar ou restringir direitos trabalhistas, havendo exceção somente em relação ao que está assegurado pela Constituição Federal. O legislado versus negociado e a mudança que esse tipo de argumento trouxe para as conversas entre trabalhadores/as e patrão na hora de negociar acordos é o tema da quarta matéria da série sobre negociação coletiva.

O julgamento, a que a gente se refere, ocorreu por conta de uma ação que envolvia o chamado ‘legislado versus negociado’, argumento jurídico que foi estabelecido durante a Reforma Trabalhista promulgada pelo governo golpista de Michel Temer em 2017.

A ação julgada pelo STF, e que resultou contra aos direitos da classe trabalhadora, era sobre uma cláusula de um acordo firmado entre a empresa Mineração Serra Grande S.A. e o sindicato da categoria, que previa o fornecimento de transporte para o deslocamento de trabalhadores/as até o local de trabalho, mas suprimiu o pagamento referente ao tempo de percurso. A maioria dos ministros do Supremo concordou com o patrão e o caso virou precedente jurídico para outros semelhantes.[veja abaixo os direitos que estão em jogo]

Este novo instrumento jurídico, legalizado após o julgamento, permite que acordos coletivos, em geral negociados entre empresas e sindicatos, em que são estipuladas condições de trabalho, reajustes salariais e outros benefícios, possam retirar direitos conquistados.

Segundo o advogado especializado em Direitos Humanos do Trabalho e Direito Transnacional do Trabalho, Antonio Fernando Megale Lopes, mesmo antes do estabelecimento do ‘acordado versus legislado’ pela Reforma Trabalhista em 2017, já haviam disputas na Justiça do Trabalho e em instâncias superiores para expandir a validade das cláusulas coletivas, expandindo as negociações.

“No ano de 2015, em mudança jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal julgou o RE nº 590.415, caso que ficou conhecido como PDI-BESC. A Justiça do Trabalho não tinha reconhecido a validade da cláusula de acordo coletivo do BESC (Banco do Estado de Santa Catarina), que previa uma quitação geral sobre indenização recebida em programa de demissão incentivada instituído pelo banco e incluído em acordo coletivo. O banco recorreu ao STF. O Supremo, então, seguindo voto do Ministro Barroso, reformou a decisão para reconhecer a validade da cláusula. A decisão iniciou, assim, a mudança sobre as limitações impostas às negociações coletivas”, recorda Lopes.

Segundo ele, em setembro de 2016, também em decisão vinda do STF, o Ministro Teori Zavascki decidiu, monocraticamente, outro caso que sinalizou a prevalência do acordado sobre o legislado, o RE nº 895.759.

“Neste caso, o TST havia considerado ilegal a supressão das chamadas horas in itinere (tempo que o trabalhador gasta ao sair de casa e chegar no trabalho e as horas que ele gasta ao retornar para sua casa). Invocando o precedente de 2015, o Ministro Teori decidiu aplicá-lo sob o fundamento de que houve registro, na decisão, de que a supressão da parcela foi compensada com outros itens específicos de vantagens compensatórias concedidas”, completa o advogado.

Ele avalia que a prevalência do negociado sobre o legislado não é benéfica para o/a trabalhador/a, já que podem ser negociados, entre os dois, direitos em troca de vantagens que nem sempre são benéficas para quem trabalha.

“No direito do trabalho, o que deveria prevalecer sempre é a norma mais benéfica. Diante do chamado princípio da norma mais benéfica, não se pode privilegiar os acordos coletivos frente às convenções se forem prejudiciais a quem trabalha”, alerta.

Sindicato forte impede perdas

Como já vimos nas matérias anteriores, com o aumento das negociações individuais entre empresas e sindicatos, e diminuição dos acordos coletivos após a Reforma Trabalhista, a negociação coletiva perdeu força e restou aos sindicatos o papel de defender direitos historicamente conquistados de mais ataques.

A esperança do movimento sindical agora é que, com a chegada do novo governo Lula, o diálogo com os trabalhadores seja restabelecido e a negociação coletiva seja reforçada.

Veja em quais direitos acordados prevalecem sobre o legislado

- jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;

- pacto quanto à jornada de trabalho

- banco de horas anual

- intervalo intrajornada (limite mínimo de 30 minutos em jornadas acima de 6 horas)

- plano de cargos e salários ou cargos de confiança

- regulamento empresarial

- representante dos trabalhadores no local de trabalho

- teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente

- remuneração por produtividade e gorjetas

- modalidade de registro de jornada de trabalho

- troca do dia de feriado

- enquadramento do grau de insalubridade. Reflete no salário e nas condições de trabalho. Como por exemplo, ter equipamentos adequados ao trabalho, como roupa para ter acesso à câmara fria de um frigorífico;

- prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;

- prêmios de incentivo

- participação nos lucros e resultados (PLR) da empresa

O que não pode ser negociado

Os direitos contidos no artigo 7ª da Constituição, dos trabalhadores urbanos e rurais, não podem ser mexidos como: salário mínimo, direito a férias, ao 13º salário, entre outros, como:

- seguro-desemprego, em caso de demissão sem justa causa;

- fundo de garantia do tempo de serviço;

- salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado;

- décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;

- remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;

- salário família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei;

- duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

- repouso semanal remunerado;

- remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% ao normal;

- gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;

- licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 dias;

- licença paternidade, nos termos fixados em lei;

- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei e;

- aposentadoria, entre outros.


A última matéria da série sobre negociação coletiva, que vai ser publicada na próxima semana, vai tratar da luta dos/as metalúrgicos/as pelo Contrato Coletivo Nacional e traz o exemplo da Tyssenkrupp, que já possui um acordo nacional de trabalho.

Fonte: CNM/CUT

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