Mercado de trabalho: menor diferença de salário desestimula rotatividade
O preço da rotatividade da mão de obra ficou mais caro este ano. Nos primeiros seis meses de 2010, a diferença entre o salário médio dos demitidos e dos admitidos caiu quase pela metade em relação a igual período do ano passado. De janeiro a junho, o salário médio dos novos contratados foi de R$ 821,13, valor 7,2% inferior ao salário dos demitidos no mesmo período.
O salário médio real de admissão nos primeiros seis meses deste ano ficou em R$ 821,13 - 4,8% maior que em igual período de 2009, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgados pelo Ministério do Trabalho.
O crescimento foi maior no Sul e no Nordeste, onde alcançou quase 6%, e menor nas demais regiões, mas em todas elas a tendência é de aumento da remuneração inicial. Além do efeito salário mínimo, também o crescimento da economia, o peso da indústria na recuperação e a redução das taxas de desemprego explicam esse bom dinamismo do mercado de trabalho.
Para a professora de economia do Insper, Regina Carla Madalozzo, o aumento do salário médio (geral ou de admissão) está diretamente relacionado à redução da taxa de desemprego. De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego médio do primeiro semestre foi de 7,33%, abaixo do registrado em igual período de 2008 (8,27%), outro ano de economia forte, observa Regina.
"Quando a taxa de desemprego está em queda, a tendência é de aumento do salário médio", diz ela.
O economista Fábio Romão, da LCA, também ressalta a tendência de aumento dos rendimentos, da qual o aumento do salário de contratação é um indicativo. Pelos dados da pesquisa do IBGE, o salário real dos trabalhadores da construção civil em julho foi 14,2% maior que o recebido em igual período do ano passado, quase o triplo do aumento real de 5,1% do rendimento médio de todas as funções.
Nos primeiros seis meses deste ano, o salário médio de admissão subiu muito mais que o de demissão (que ficou praticamente estável quando a inflação é descontada), levando a uma queda na diferença entre eles - de 13,2% em 2009 para 7,2% este ano.
A redução da diferença para um nível inferior a 10% recupera a relação existente em 2008, quando os novos empregados foram contratados com uma remuneração, em média, 6,8% inferior a dos demitidos.
O crescimento acelerado e a consequente demanda por mão de obra qualificada em diferentes setores da economia fazem com que as empresas aumentem o salário de admissão para contratar os melhores funcionários "disponíveis", ou mesmo para incentivar que outros profissionais troquem de emprego, saindo de uma ocupação com menor remuneração para outra que permita uma renda mensal maior.
É normal, explica Romão, que o salário de admissão seja menor do que o de demissão. Isso ocorre, entre outras razões, porque existe um número expressivo de pessoas sendo contratadas pela primeira vez, e também o retorno ao mercado de pessoas que estavam desempregadas, e que, por isso, aceitam um emprego com remuneração menor.
Pelos dados do Ministério do Trabalho, no primeiro semestre de 2010, 15% dos 9,7 milhões de admitidos estavam obtendo o primeiro emprego.
Regina, do Insper, também credita a queda na diferença entre os salários de admissão e demissão à composição do emprego. Nos dados divulgados ontem, relativos ao mercado de trabalho formal em agosto, entre os setores que mais puxaram, proporcionalmente, a alta do emprego, estão segmentos como indústria extrativa e administração pública, cujo salário é superior à média.
"A composição do emprego também influencia esse resultado", observa a professora.
Um das consequências do aprofundamento da tendência de redução da distância entre os salários é a redução dos índices de rotatividade da mão de obra. No fim do ano passado, segundo a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), pela qual as empresas informam o total de funcionários contratados, estavam empregados no país 41,2 milhões de pessoas.
Nos primeiros seis meses deste ano, 8,2 milhões desses trabalhadores foram desligados, seja por decisão da empresa, seja por iniciativa do funcionário, enquanto outros 9,7 milhões foram admitidos, segundo o Caged.
Embora sejam pesquisas diferentes, elas podem ser cruzadas para indicar uma tendência, e esse dado aponta para uma rotatividade de 20% da mão de obra total do país.
Na mesma comparação, a rotatividade da indústria, comércio e serviços é semelhante (variou de 22% a 25% no primeiro semestre deste ano), enquanto é muito maior na construção civil (47%) e na agropecuária (39%) e muito menor na administração pública (3%), onde a estabilidade é a regra na maior parte das contratações.
As novas admissões, observa Sérgio Mendonça, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) nem sempre são para a mesma vaga, especialmente em setores como construção civil e agropecuária, onde há contratações muito temporárias, seja por safra, seja por obra.
"Mas em outros setores, a hipótese com as quais os estudiosos mais trabalham é de que as empresas demitem salários mais altos e contratam novos empregados com menor remuneração como um instrumento para reduzir custo", observa Mendonça.
Segundo ele, quanto menor for a distância entre os dois salários, menor será a rotatividade. Mas uma parte da rotatividade, diz, é iniciativa do trabalhador, especialmente em momentos como o atual, onde ele pode trocar de emprego para ganhar mais, se for um bom profissional.
Outra parcela, impossível de ser estimada, é aquela em que o trabalhador entra em acordo com o empregador para "sair" do emprego e usufruir de verbas como FGTS e seguro-desemprego. Para Mendonça, essa parcela é marginal.
Fonte: Denise Neumann / Valor Econômico