Para Pochmann, reverter retrocessos exigirá Parlamento comprometido com projeto nacional

Agência Brasil
Para Pochmann, reverter retrocessos exigirá Parlamento comprometido com projeto nacional

Economista falou ao Brasil de Fato sobre cenário econômico do atual governo e possibilidades de superação

O número de pessoas com com fortuna maior que US$ 1 milhão aumentou em 7 mil no Brasil durante 2017. Um incremento de 4,25%, aumentando de 164,5 mil pessoas para 171,5 mil. Somado, o patrimônio total deste grupo equivale a US$ 4,5 trilhões, crescimento de mais de 8% em relação a 2016. Os dados são da consultoria francesa Capgemini.

Do outro lado, segundo o Instituto Brasileiro de Economia da FGV a desigualdade aumentou: no primeiro trimestre de 2018 em comparação com o mesmo período do ano anterior, os 20% mais pobres tiveram queda de 5% em sua renda, enquanto a dos 20% mais ricos aumentou em 10,8%. A renda dos que integram os estratos inferiores diminuiu de R$ 400 para R$ 380.

Comentando esse cenário em entrevista ao Brasil de Fato, o economista Marcio Pochmann, o Brasil enfrenta o pior cenário econômico desde a década de 1930. Em sua visão, as alterações promovidas por Michel Temer (MDB) devem ser responsabilizadas por isso. Para que sejam revertidas em um próximo governo, entende que a discussão sobre a composição do futuro Parlamento deve ter uma importância maior durante as eleições gerais.

Brasil de Fato: Há dados indicando uma piora na questão da igualdade no Brasil no último ano. O quanto isso é responsabilidade direta de Temer e o quanto pode ser creditado à crise econômica iniciada antes de sua chegada ao governo?

Marcio Pochmann: A recessão, a partir de 2015, já colocou constrangimentos para o rendimento dos trabalhadores. Houve o aumento do desemprego, ou seja, mais pessoas sem rendimento. Esse é o primeiro aspecto. Não poderia deixar de chamar a atenção de que a opção pela recessão significou um desvio da política de crescimento e de busca do pleno emprego que havia sido uma marca desde o início dos governos do PT.

Ocorre que esta interrupção, a partir da recessão, foi aprofundada pelo uso generalizado de políticas de corte neoliberal com a entrada do governo Temer. Aparecem constrangimentos que não estavam colocados anteriormente. A redução do gasto social, com a decisão de estabelecer um teto para a expansão do gasto público, excluindo os gastos financeiros. Adicionalmente, tivemos a própria mudança na legislação trabalhista.

Temos constrangimentos do ponto de vista do gasto público, que em tese sustentariam a renda do trabalho, mesmo que diante de uma recessão, e, ao mesmo tempo, a liberalização do mercado de trabalho que tornou, de alguma forma, não o crescimento do emprego mas a redução do custo do trabalho para quem está empregado.

Em 2014, o custo do trabalho brasileiro na indústria era quase quatro vezes maior que na indústria chinesa. Em 2018, o custo do trabalho brasileiro já é um quinto menor que o chinês. O que nós estamos assistindo por força da mudança na legislação trabalhista é a precarização acelerada dos empregos existentes. A substituição do emprego regular por empregos que são caracterizados por contratos de zero hora. Ou seja, a empresa contrata a pessoa e a remuneração e os direitos [são] vinculados à jornada estabelecida. Você pode trabalhar zero hora no mês. Não há mais garantia de um rendimento mensal.

Você citou alterações legislativas e constitucionais que geraram esses constrangimentos. Como um próximo governo poderia superar esse cenário econômico com essas limitações legais?

É necessário trabalhar com duas medidas de implementação imediata a partir da saída do governo Temer. A primeira, um conjunto de medidas emergenciais. Nós estamos com o país diante da mais grave crise de emprego que a sociedade urbano-industrial já assistiu. Não há paralelo desde 1930. Segundo o IBGE, temos quase 28 milhões de brasileiros procurando trabalho. Isso significa que cerca de 27% da força de trabalho esta nessa situação. Não há registro histórico disso.

De imediato, medidas que permitam que o Brasil venha a se mover diante do buraco em que se encontra. Vai desde a retomada de obras públicas paralisadas até a implementação de um programa de obras públicas em pequena escala nos municípios. Com o objetivo de retirar a economia da situação de paralisia em que se encontra.

A segunda medida, que devem ser medidas de transição do governo Temer para um novo governo. O que seria essa transição? A revisão de medidas que foram tomadas e que imobilizaram o governo e retiraram qualquer possibilidade de protagonismo do Estado. Isso diz respeito a rever a Emenda Constitucional 95 e também a alteração da legislação trabalhista.

Essa transição, e mesmo as medidas emergenciais, dependerão de alguma forma, não apenas do resultado da eleição presidencial, mas também, e sobretudo, da composição do Legislativo. Sem um Parlamento convergente com essa perspectiva, o próximo Governo terá enormes dificuldades para passar medidas que possam rever os equívocos que o governo Temer tomou.

A Fundação Perseu Abramo, presidida por você, juntamente com outras fundações partidárias lançou um manifesto defendendo a conformação de uma frente parlamentar com essas características. Qual a expectativa real de que possa ocorrer uma unidade nesse sentido?

Esse foi o ponto que reuniu que deu convergência a essas cinco fundações partidária. Em um primeiro momento, a identificação de que nós temos um rebaixamento do debate sobre o Brasil no plano do Legislativo. O Legislativo não produz um debate sério, de alto nível, sobre os problemas brasileiros, tampouco sobre as soluções. Ao mesmo tempo, a necessidade de ter uma bancada suprapartidária comprometida com o projeto nacional.

Essa iniciativa é inédita, se recuperarmos as eleições desde o país saiu da ditadura para a democracia. Nós temos um paralelo histórico recente para saber se terá viabilidade ou não. Em geral, as frentes, e há várias delas no Parlamento brasileiro, são constituídas com deputados eleitos. Agora, na verdade, se enuncia a formação de uma frente pré-eleição. A ideia é levar o debate ao Brasil sobre o que é o projeto nacional. Identificar candidatos comprometidos com essa agenda e buscar uma politização da sociedade para apoiar candidatos com essa perspectiva. Se a população vai votar em candidatos preocupados com propostas e planos voltados para a recuperação do país e da soberania que isso se dê em um quadro em que os parlamentares possam acompanhar da forma mai próxima possível.

Fonte: Brasil de Fato

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