Movimento sindical precisa renovar a agenda de lutas no campo e transformar conquistas em políticas de Estado
Após promover seminários e a organização dos macrossetores da indústria, serviço público e comércio, serviços e logística, a CUT promoveu na manhã desta quinta-feira (30) um encontro de dirigentes do setor rural para discutir os desafios no campo.
Secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, apontou que a divisão das categorias cutistas em macrossetores surgiu diante da necessidade de repensar a atuação do movimento sindical perante as mudanças que o mercado de trabalho sofre.
“Temos que readequar a nossa organização por conta das transformações pelas quais passamos com o objetivo de construir uma estratégia nacional, mas também dialogando com as diferenças regionais”, afirmou.
O sociólogo e professor da Universidade Federal do ABC Arilson Pavareto participou da atividade e assinalou que a organização dos trabalhadores no campo vive um momento de crise, encoberta pelos dois últimos governos populares que foram muito favoráveis á agricultura familiar.
“O sindicalismo rural não tem feito o que patronal faz. A CNA (Confederação Nacional da Agricultura) faz mudança constitucional, como o Código Florestal, o projeto para deixar com o Congresso Nacional a demarcação de terras indígenas. Enquanto isso, o movimento sindical luta por mudanças estruturais. As bandeiras de luta não mudaram nas últimas décadas e esse caráter de crise encoberta pode virar uma crise aguada, quando mudar o governo”, alertou.
Para ele, medidas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foram acertadas, multiplicaram os recursos para os produtores familiares, mas demonstram esgotamento e não institucionalizaram as mudanças, que estão suscetíveis a retrocessos.
“O que foi feito é aquilo que a gente reivindicava. Agora, esse grande ciclo de quase 20 anos, de fazer com que o Estado reconheça que há agricultura familiar, que é prioridade, começa a bater no teto. O caminho é disputar o Mercado, o que é complexo, porque o sindicalismo rural sempre foi voltado ao Estado e há um conceito entre nós de que Mercado é onde se realiza o lucro, que é capitalista. Há Mercados que se organizam sobre outras bases, como solidariedade, cooperação, na valorização da biodiversidade, de práticas mais sustentáveis de agricultura. Essa deveria ser o desafio a ser tratado pela agricultura familiar, disputar o Mercado sem esquecer da necessidade de políticas públicas”, disse.
Atuação regional – O professor explicou que a agricultura brasileira ganhou muita importância para a consolidação da renda do país, porém, produzindo cada vez mais com menos gente.
Pavareto apontou ainda que há diferenças regionais em relação à forma de produção, das áreas de cerrado, como Mato Grosso do sul, Mato Grosso e Maranhão, onde não há uma rede de cidades e o crescimento não representa oportunidades para população rural, até o Sul do país, onde o perfil é de uma agricultura familiar mais consolidada e voltada ao Mercado, com uma rende de cidades densa, que não exige a migração para regiões distantes em busca de trabalho.
Ele defende que essa pluralidade demanda uma diversificação da agenda sindical, condizente com a variedade regional do país. “Será que agenda sindicalismo rural pode se resumir à agricultura familiar? Parece que não.”
Desafios para o movimento sindical –Entre os caminhos para a atuação da organização da classe trabalhadora no campo, o professor defendeu que o primeiro passo é separar o joio do trigo no enfrentamento aos patrões.
“O sindicalismo rural entrou no engodo do agronegócio, que é comparar o dono da terra com aquele empresário mais nocivo, que não está preocupado com a produção, porque se a safra não render nada, bate no banco e ganha perdão da dívida. Aquele que usa a terra para ter mão de obra barata, ser prefeito ou deputado. Usa a terra como patrimônio e elemento de dominação e não para produção. Quando a gente diz agronegócio e coloca todo mundo junto, a sociedade pensa em uma grande fazenda produtiva e moderna. Temos que fazer a distinção, mas enfrentamos resistência patronal, porque a força econômica de um entra com força política de outro, no Congresso, por exemplo”, explica.
O professor destaca que é preciso diminuir as bases espúrias da agricultura patrimonialista, que tem ainda sérios problemas ambientais. Segundo ele, é preciso fazer alianças com movimentos ambientalistas para enfraquecer esse setor.
Outro papel das lideranças no campo, cita, é “ganhar” o pequeno produtor para a agricultura familiar, em enfrentamento ao processo de aliciamento que faz a CNA. “Há setores dos produtores familiares que acabam se reconhecendo como agronegócio porque querem participar da produção em larga escala, da comercialização em grandes proporções.”
Desenvolvimento também no campo – Além disso, avaliou, o movimentos sindical no campo deve ir além do discurso produtivista, lutar para que políticas de educação, saúde e transporte cheguem ao campo, como forma de evitar o esvaziamento das regiões rurais.
Parte desse processo, defendeu, depende da reforma no Ministério do Desenvolvimento Agrária (MDA) e no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que tenham mais orçamento, pessoal e possam ter pautas e projetos regionalizados.
“A demanda mundial por produtos com tecnologia agregada não será maior do que por alimentos. Por isso as transnacionais compram terra e vão investir na agropecuária. O fortalecimento da importância do setor empresarial na agricultura veio para ficar e o enfrentamento só vai piorar nos próximos anos. Temas como internacionalização da agricultura brasileira, do controle de sementes, do mercado da agricultura familiar deveriam ser tão importantes quantos as políticas públicas.”
Por Luiz Carvalho/CUT