Fórum Social Mundial debate reconstrução do Brasil como nação democrática
Lideranças partidárias, sindicais, movimentos sociais se reuniram, nesta terça-feira (24), no Auditório Dante Barone da Assembleia Legislativa do RS, para debater “O novo Brasil que queremos construir”, tema da segunda mesa de convergência, do Fórum Social Mundial. A atividade teve mediação das deputadas federais Daiana Santos (PCdoB/RS) e Reginete Bispo (PT/RS).
Antes do início do debate, por volta das 19h, a presidenta do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz (Cebrapaz), Jussara Cony, e a presidenta da União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro) do Rio Grande do Sul, Elis Regina de Vargas, fizeram a leitura do documento norteador da mesa. O texto enfatizou os desafios para o próximo período após a derrota eleitoral do “monstro do fascismo”.
“É preciso garantir um cotidiano, retomar e reconstruir a nossa dignidade como nação livre, democrática, humanitária e soberana. Assim, com a eleição do operário Lula da Silva pela terceira vez presidente, o olhar do mundo se volta para o Brasil como referência no enfrentamento às desigualdades e no traçar caminhos de igualdades e paz. Essa vitória foi legitimada pelo povo brasileiro através de nossas maiores riquezas: a diversidade humana e cultural, aliada à grandiosidade da nossa biodiversidade”, diz trecho do documento.
A mesa foi composta pelo representante do Comitê Internacional do FSM, Oded Grajew, a deputada federal e presidente Nacional do PT, Gleisi Hoffmann, a deputada estadual Juliana Brizola (PDT), a deputada estadual e presidente estadual do PSOL, Luciana Genro, o presidente estadual do PCdoB, Juliano Roso, o presidente estadual do PSB, Mário Bruck, o presidente estadual da Rede, André Costa, e o presidente estadual do Partido Verde, Márcio Souza.
Na abertura as deputadas federais Reginete e Daiana destacaram o processo árduo que foram as eleições de 2022, assim como a esperança para o próximo período. “Foi com muito trabalho, luta de cada cidadão, cidadã, que nós derrotamos nas urnas esse monstro do fascismo. Mas sabemos que temos esse desafio de derrotar esse monstro no cotidiano, no dia a dia”, frisou Reginete.
“Vou ficar de pé, junto com vocês para celebrar a volta da esperança, do Brasil da esperança, da democracia. Esse é o momento único e histórico que nós retomamos, com esse fôlego, com alegria, junto com os movimentos que são a base da política que nós fazemos”, afirmou Daiana.
A desigualdade é inconstitucional
Representante do Comitê Internacional e um dos fundadores do FSM, Oded Grajew destacou a importância de diminuir as desigualdades. De acordo com ele, os países que atingiram os melhores indicadores sociais, ambientais, econômicos, políticos e éticos foram os que escolheram o caminho da redução das desigualdades.
“O Brasil, apesar de ser uma das maiores economias do mundo, é um dos campeões mundiais da desigualdade. No Brasil 5% da população detém 95% da renda, 1% da população detém metade da riqueza nacional. A distância entre ricos e pobres é enorme. Sem reduzir a desigualdade no Brasil não iremos construir, como não construímos o país que nós sonhamos. E reduzir as desigualdades não é apenas uma declaração, são atos, ações”, ressaltou.
Oded entende que para a redução da desigualdade é preciso um envolvimento de toda a sociedade e não apenas do governo. “A redução da desigualdade deveria ser a grande bandeira de todos nós, porque se não reduzirmos, o Brasil que queremos é sonho de uma noite de verão. E reduzir as desigualdades não é fácil, porque significa redistribuir poder e riqueza. É necessário uma grande mobilização e vontade política. É preciso ampliar a educação pública de qualidade, implantar um sistema tributário progressivo e ter uma representação política que reflita a diversidade da sociedade e promova ações que busquem reduzir as desigualdades de gênero, raça, social, econômica, territorial”, apontou.
Soluços de Democracia
A deputada federal e presidenta Nacional do PT, Gleisi Hoffmann, destacou a vitória sobre o fascismo e a certeza de que se conseguirá derrotá-lo na sociedade, bem como a importância do FMS como ferramenta desse processo. Falou também dos desafios para o próximo governo.
“Esse período que estamos vivendo, tirando o período do Bolsonaro e depois do golpe da Dilma, foi o período mais longevo de democracia no Brasil. Durante toda a nossa história tivemos soluços de democracia e nunca tivemos um Estado voltado para a inclusão social e o combate a desigualdade, a elite brasileira sempre foi caracterizada pelo atraso, pelo autoritarismo e sempre foi escravocrata”, expôs.
Ela também pontuou que ganhar a eleição do Bolsonaro não foi simples. “A extrema direita tem uma base popular no Brasil, se organizou e depois de estar na presidência da República, utilizou a máquina do Estado como nunca fez em nenhuma outra eleição do Brasil. Foram quase R$ 300 bilhões de gastos nesse período, além das fake news, do financiamento internacional.”
Gleisi destacou que a vitória de Lula se deve à resistência, a luta dos movimentos sociais, sindicais, da base popular da sociedade. “Agora para nós se desenha um grande desafio. Foi uma vitória apertada, isso mostra que não vai ser um governo tranquilo. Muito diferente de 2003, 2010, esse é um governo de disputa na sociedade, pela organização da extrema direita. E esse é um governo que pela sua composição de coalizão, de frente ampla, também é um governo de disputa na sua linha, temos que estar preparados”.
"Não mais compactuar com golpistas"
A deputada estadual Juliana Brizola (PDT) pontuou que o novo governo nasce da lucidez do povo brasileiro. “Meu avó Leonel Brizola dizia que acreditava na lucidez do povo brasileiro e foi a lucidez do povo brasileiro que colocou Lula na presidência.”
Citando os ataques do dia 8 de janeiro, a parlamentar lembrou da importância da luta pela democracia que Brizola travou na campanha da legalidade. "Tem algo que me incomoda demais e que talvez tenha chegado a hora de encararmos. O nosso país, na América Latina, é um dos únicos países que fez a anistia ampla e irrestrita. Isso significa perdoar torturador, perdoar aqueles que perseguiram pessoas pelo modo de pensar. Varremos para debaixo do tapete um período muito difícil na vida da sociedade brasileira. Um povo que não conhece sua história pode repeti-la de uma forma equivocada”, afirmou, enfatizando que não se pode mais compactuar com golpistas.
Um longo caminho pela frente
Na avaliação da deputada estadual Luciana Genro (PSOL), frente ao que aconteceu no domingo, dia 8 de janeiro, ainda há um longo caminho. “Foi uma tentativa de golpe. É a pura demonstração de que a derrota da extrema direita nas urnas ainda não está completa nas ruas. A extrema direita vai seguir tentando impedir que o presidente cumpra seus compromissos de campanha. Essa é a realidade que vamos defrontar nos próximos quatro anos.”
Ao resgatar a fala dos painelistas anteriores, a parlamentar pontuou que, em relação à redução das desigualdades, é importante a taxação das grandes fortunas. Também que é preciso garantir o cumprimento do compromisso de Lula de rever a tabela do imposto de renda, isentando quem ganha ate R$ 5 mil e cobrando de quem pode pagar.
“Nós ainda temos um Estado verdadeiramente democrático de direito a construir, para isso é preciso enfrentar as desigualdades, é preciso da justiça transição, a punição daqueles que vilipendiaram o nosso país nos últimos quatro anos. A punição ao genocídio dos yanomamis, do genocídio que aconteceu durante a pandemia. Não pode ter anistia aos golpistas, aos genocidas, aos bandidos que saquearam o Estado brasileiro. Enquanto o Estado democrático de direito não for verdadeiramente democrático e não for para todos, ele não será um instrumento de democracia real”, argumentou.
Mobilização para derrotar o fascismo
Presidente estadual do PCdoB do RS e ex-deputado, Juliano Roso enfatizou a necessidade de continuar isolando e derrotando o fascismo no Brasil. “Eles tentaram dar um golpe e conseguimos impedir porque essa ideia da democracia, da Frente Ampla, é uma ideia vitoriosa na sociedade brasileira. Agora precisamos dar um passo a frente. Essa turma da extrema direita brasileira está organizada, com dinheiro, com comunicação, com base social radicalizada. Só tem uma forma de responder a isso: é o povo na rua organizado, não podemos tirar o pé da rua”, defendeu.
De acordo com ele, houve uma vitória eleitoral, política, e agora se precisa ter uma vitória ideológica. “Isso exige uma tarefa conjunta, complexa, coletiva, não podemos dar trégua, nesse debate que tem que se também no campo judiciário”, disse.
Na mesma linha, o presidente estadual da Rede, André Costa, enfatizou que unidade entre os partidos precisa se materializar no dia a dia. “Nós vencemos uma eleição muito difícil, se eles tivessem ganhado teriam acabado com todos os direitos. Precisamos ir para as ruas, mobilizar os sindicatos, movimentos sociais, para que a gente possa retomar o direito, por exemplo, do trabalhador fazer a sua rescisão dentro do sindicato e não abaixo dos olhos do patrão. É preciso que esse Fórum, que sempre nos traz grandes avanços, entenda que o nosso papel neste governo, para derrotar o fascismo, é mobilizador”.
O presidente estadual do PSB, Mario Bruck, destacou as dicotomias do Brasil. “Nosso país é um pais de riqueza e desigualdade, de luxo e miséria, beleza cultural e violência”. Ele lembrou da necessidade de reinventar o fazer político e, como os demais palestrantes, enfatizou a importância de mobilizar a sociedade para a luta pela redução das desigualdades.
“Queremos construir uma perspectiva política pela qual vale a pena viver e lutar, queremos igualdade de gênero nas relações sociais e paridade política, bem como o enfrentamento de todas as formas de violência. Um país que não discrimina, onde todos e todas importam e têm oportunidade para prosperar e viver com dignidade. Precisamos da transformação estrutural a longo prazo por meio do aprofundamento da democracia. O Brasil que queremos construir defende a priorização de investimento na educação”, exemplificou.
Presidente estadual do Partido Verde, Márcio Souza, fez um resgate do tempo em que atuou como chefe de gabinete do então ministro da Justiça, Tarso Genro, elencando os avanços e projetos desenvolvidos e a reação da direita naquele período.
“Não bastava para a direita, para os democratas liberais, a sua garantia de lucro pela expansão de mercado interno, e com um player mais potente do mercado internacional, jogar o jogo democrático. Eles não estavam satisfeitos. Percebemos, de um lado, que eles não estavam satisfeitos de dividir os assentos dos aviões com a classe trabalhadora e, por outro, eles não queriam ascensão de uma classe trabalhadora consciente que pudesse apontar para a mudança da classe dirigente do país efetiva”, comentou Souza, citando como exemplo o ProUni. Ele também apresentou propostas, para que não se repitam os erros do passado, entre eles a questão ambiental.
Fonte: Fabiana Reinholz (Brasil de Fato RS)