Empresa de segurança é acusada de práticas antissindicais na América do Sul

São Paulo – Instalação de microfones e câmeras para espionagem do trabalho, demissões de trabalhadores com direito a estabilidade, ligação para familiares de funcionários em greve, oferta de benefícios econômicos para empregados que se desfiliassem dos sindicatos e contratos temporários utilizados como ferramentas para evitar a organização sindical estão entre as práticas feitas pela Prosegur, multinacional espanhola especializada em serviços de segurança e transporte de valores.

Acusada de violação de direitos humanos e trabalhistas no Brasil, Peru, Paraguai e Colômbia, a empresa foi denunciada na última terça-feira (26) pela Uni Global Union – federação sindical internacional que representa aproximadamente 20 milhões de trabalhadores – ao Ministério da Economia e Competitividade da Espanha.

A entidade afirma que a Prosegur não cumpre as diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com normas mínimas para uma conduta empresarial responsável, para multinacionais na América Latina. A Espanha abriga a sede da empresa e é um país-membro da OCDE, tendo estabelecido um Ponto de Contato Nacional (PCN) com a responsabilidade de promover as diretrizes por parte de empresas multinacionais espanholas no exterior.

As denúncias constam do dossiê Violações de Direitos Humanos na Cadeia Produtiva: Um Estudo de Prosegur na América do Sul, elaborado pela Uni Global Union. “A UNI vai combater em distintos fóruns internacionais o duplo discurso da Prosegur. A empresa se diz socialmente responsável, no entanto, nós temos uma série de documentos que provam que isto não é assim, já que uma empresa socialmente responsável estaria disposta a dialogar com representantes dos trabalhadores e mudar as más condutas relacionadas a direitos trabalhistas e sociais”, afirma a secretária regional da UNI Américas, Adriana Rosenzvaig.

Segundo informações de sindicalistas, não confirmadas pela Prosegur, a empresa participa de concorrência para prestar serviços de segurança nas Olimpíadas de 2016. "Em outubro, participamos de uma reunião com representantes do comitê dos Jogos Olímpicos e fomos informados que o processo de licitação para a segurança dos jogos em 2016 ainda não foi instaurado. Sabemos que a Prosegur está nessa disputa e estamos avisando o comitê que empresa a contratada, seja ela nacional ou não, deverá obedecer os princípios da legislação brasileira", afirma o presidente da Confederação Nacional dos Vigilantes e Prestadores de Serviços (CNTV-PS), José Boaventura Santos.

"Trabalhamos para aperfeiçoar nosso ponto de interlocução e apoio a uma rede internacional, e queremos denunciar as práticas que atentam contra a organização do trabalho e a liberdade sindical", acrescenta Boaventura. "Para nós, é inaceitável que uma multinacional possa chegar aqui e adotar práticas que fere os princípios fundamentais da dignidade na tentativa de manter essa cultura de violência contra as pessoas."

O coordenador de campanhas da Uni Global Union, Maurício Rombaldi, afirma que essas práticas não se repetem por erro gerencial, mas como uma política da empresa. "Recebemos denúncias de diferentes países. A ideia não é que a Prosegur perca contratos, mas queremos denunciar aos clientes a situação vivenciada pelos trabalhadores."

Brasil
No Brasil, a Prosegur emprega aproximadamente 52 mil pessoas, em 25 estados e no Distrito Federal, sendo o maior grupo de segurança privada do país, segundo informações do site da empresa. O faturamento somou R$ 2,7 bilhões em 2012.

Na Paraíba, o juiz David Sérvio Coqueiro dos Santos, da 5ª Vara do Trabalho de Campina Grande, constatou “falta de cumprimento por parte da empresa de pagar o adicional de periculosidade aos trabalhadores que tem atividade diretamente ligada a vigilância patrimonial e pessoal”. Na sentença, ele determina o cumprimento da Lei 12.740/2012, que redefine os critérios para avaliação de atividades perigosas.

"A empresa, por não realizar o pagamento, acaba por diminuir seus custos, de forma ilegal, violando a livre concorrência às custas dos direitos sociais dos trabalhadores. Isso é dumping social. Baixar custos para ter vantagem frente a concorrência às custas dos direitos de seus empregados", afirma Santos. "Alguns países fazem isso através da legislação - que não garante direitos mínimos aos trabalhadores – fazendo com que estes países tenham vantagem no recebimento de novas empresas e investimentos. Algumas empresas fazem mediante descumprimento da lei, com no caso presente", completa.

Segundo o Ministério Público do Trabalho do Espírito Santo, entre as ações no MPT contra a empresa, estão denúncias por diferentes infrações da CLT: deixar de conceder intervalo para repouso ou alimentação, de no mínimo uma hora, para os trabalhadores; manutenção do empregado trabalhando sob condições contrárias às convenções e/ou acordos coletivos de trabalho; coação aos vigilantes para realização de exames médicos periódicos e cursos de reciclagem nos finais de semana, não pagamento de horas extras, entre outros. As ações estão em acompanhamento processual na Justiça do Trabalho.

Ainda no Espírito Santo, os trabalhadores da companhia começaram a sentir as práticas antissindicais durante os 66 dias em que estiveram em greve, a partir de abril, por reajustes salariais e melhores condições de trabalho. De acordo com sindicalistas, durante o período de paralisação a empresa ligou para os familiares dos funcionários em greve, pedindo para que eles voltassem ao trabalho, além de colocar um anúncio no jornal para contratações e deslocar trabalhadores de outras regiões, entre as quais São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás, para substituir os grevistas.

O artigo 7º da Lei de Greve (nº 7.783, de 1989) proíbe a rescisão de contrato de trabalho durante a paralisação, assim como a contratação de substituto, com exceção de hipóteses previstas em outros artigos, nos casos em que a interrupção dos serviços resultem "em prejuízo irreparável".

A campanha salarial foi a dissídio coletivo, instaurado pela empresa no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Espírito Santo, já que segundo os dirigentes a Prosegur se recusou a negociar com os trabalhadores. No julgamento, a greve foi considerada não abusiva, e a Justiça determinou o fim do banco de horas e o pagamento das horas extras trabalhadas, além de reajuste salarial de 12%, aumento no piso, cumprimento da lei de periculosidade e integração no adicional de risco de 30% nos salários, com pagamentos retroativos a 1º de maio (data-base).

A Prosegur recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) e conseguiu o retorno do banco de horas e redução do reajuste para 6,97%.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Carro Forte, Transporte de Valores, Escolta Armada e Tesouraria do Espírito Santo (Sindfortes), Wildson Damacena, conta que começou a sofrer represálias em 2009, ainda quando era integrante da Cipa, ao fazer denúncias ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) quanto às más condições de trabalho e irregularidades nos carros-fortes. Entre elas, problemas com cinto de segurança e freios, folga na direção que poderia provocar acidentes, farol quebrado ou sistema de climatização do carro em más condições de uso.

Damacena e o secretário-geral do sindicato, Gilberto Sales Abreu, foram demitidos por justa causa e reintegrados ao quadro de funcionários por decisões judiciais, por duas vezes. Em setembro de 2012, sentença do juiz Mário Ribeiro Cantarino Neto, da 12ª Vara do Trabalho de Vitória, determinou a reintegração dos sindicalistas e pagamento de indenização por dano moral.

Entre os fatos alegados pela empresa como falta grave para demitir os dirigentes por justa causa estavam que "os requeridos são arrogantes e presunçosos, por conta da estabilidade sindical" e a informação que os trabalhadores "iniciaram processo de desmontagem do painel do veículo da empresa em busca de equipamentos de segurança nele instalado, localizando um gravador de imagens".

Os dirigentes sindicais haviam denunciado que a empresa realizou espionagem, ao instalar em um carro microfone e câmera sem o conhecimento dos trabalhadores. Com isso, eles foram acusados por desvio de rota em trabalho, paradas ilegais não autorizadas pela empresa e entrada de terceiros no carro.

Demissões dos trabalhadores em período de estabilidade também ocorreram Distrito Federal e Ceará. Segundo o presidente da CNTV-PS, José Boaventura Santos, a empresa já chegou a demitir 80 trabalhadores, em Brasília, em função de uma greve. “É uma prática comum em outros estados brasileiros. Onde a organização dos sindicatos é mais frágil, a empresa quer deitar e rolar. Não por acaso, temos identificado na categoria um grande número de trabalhadores doentes, com nível de estresse altíssimo.”

Em resposta, a Prosegur encaminhou um comunicado no qual "esclarece que mantém uma relação de diálogo e respeito com as diversas entidades sindicais e cumpre com as obrigações trabalhistas previstas na legislação brasileira" E acrescenta: "A empresa também mantém um canal de comunicação direto que os seus colaboradores podem utilizar para tirar dúvidas, esclarecer questões sobre as condições e aplicação das Leis e Convenções Coletivas de Trabalho" e reitera "o compromisso com seus empregados e os preceitos estabelecidos em seu código de ética".

Colômbia, Peru e Paraguai
Segundo informações do site da empresa, em 2012 a Prosegur ocupava o terceiro lugar no mundo entre as companhias privadas especializadas em soluções de segurança. Emprega aproximadamente 150 mil trabalhadores, tem 400 filiais e está presente em 16 países.

Na Colômbia, segundo o documento da Uni Global Union, entre as práticas antissindicais estão "a oferta de benefícios econômicos importantes para aqueles trabalhadores que deixavam os sindicatos, e as punições aos ativistas sindicais por suas transgressões". O dossiê da organização sindical internacional também informa que a "Prosegur implementou uma tática de 'dividir e conquistar', distribuindo crachás com a mensagem Grupo do UM para que os trabalhadores que apoiavam a empresa os usassem".

Em 2010, diz o relatório, a empresa criou um pacto coletivo, assinado apenas por não sindicalizados, "uma ferramenta utilizada pelos empregadores para dar um salário melhor e mais benefícios aos empregados não sindicalizados". A entidade afirma que na Colômbia tais pactos são legítimos, mas têm restrições. "Por exemplo, é ilegal que um pacto coletivo dê condições superiores às condições negociadas nos acordos coletivos com o empregador. Em outras palavras, não podem sabotar os acordos coletivos existentes. Porém, isso é exatamente o que a Prosegur fez com seu pacto coletivo", afirma a Uni Global Union, constatando que a empresa "destruiu o sindicato"..

Em 2011, a filial da empresa no Paraguai demitiu 327 trabalhadores que participaram de uma greve da categoria. Conforme a denúncia dos sindicalistas, no Peru a empresa assinou um contrato falso para excluir o sindicato e prejudicar a negociação coletiva, além de violar as leis do país, ao utilizar contratos temporários como ferramenta para impedir a organização de sindicatos.

“Pudemos comprovar diferentes práticas antissindicais nesses países, que são questionadas por seus sindicatos locais e suas centrais sindicais nacionais. A solução é apenas uma: assinar um acordo global com o compromisso de respeitar os direitos sindicais e trabalhistas, onde quer que esteja, e desenvolva suas operações. Os acordos funcionam como uma ferramenta clara para a resolução de conflitos", afirma Adriana Rosenzvaig.

Criada em janeiro de 2000, a UNI tem aproximadamente 900 sindicatos filiados em 150 países. Dos 20 milhões de trabalhadores que a entidade representa, cerca de 2 milhões são do setor de serviços patrimoniais, que inclui a indústria da segurança privada.

Fonte: Rede Brasil Atual

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