Tarifaço na conta de luz agravará exclusão causada por atual modelo energético, denuncia MAB
por Marco Weissheimer
Em dezembro de 2016, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou um reajuste de 11,41% no preço da energia que as distribuidoras das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste compram da usina hidrelétrica de Itaipu. A nova tarifa vai vigorar de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2017. A Aneel também aprovou, no final de 2016, uma redução de 22,66% no valor da Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH), imposto pago pelas geradoras de energia elétrica à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios como compensação financeira pelo alagamento de áreas destinadas a usinas hidrelétricas.
A combinação dessas duas medidas deverá causar um aumento expressivo no preço da energia para os consumidores e do lucro das empresas geradoras de energia e uma diminuição dos recursos repassados para estados e municípios. O Rio Grande do Sul, por exemplo, que recebeu cerca de R$ 54 milhões em 2016 via CFURH deverá receber 20% a menos este ano. O alerta foi feito nesta terça-feira, por Tatiane Paulino, da coordenação do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) no Rio Grande do Sul, no seminário “Questão Energética e Direitos: atualidades e perspectivas”, realizado no plenarinho da Assembleia Legislativa.
Além de marcar a passagem o Dia Internacional de Luta Contra as Barragens, o evento teve como objetivo iniciar um diálogo sobre a questão energética nacional e estadual, a violação de direitos da população atingida por barragens e a destinação das riquezas geradas pelo setor. O dia 14 de março, assinalou Tatiane Paulino, marca uma luta internacional que questiona o atual modelo energético vigente no Brasil e em outros países da América Latina. “Estamos promovendo mobilizações em todo o país denunciando esse modelo energético e as consequências do mesmo para a população. Vivemos um momento muito difícil no país. Estamos perdendo os poucos direitos que tínhamos. Além disso, agora vai ocorrer um tarifaço nas contas de energia”, disse a militante do MAB.
Tatiane Paulino também questionou o padrão de desenvolvimento associado ao atual modelo energético. “O Rio Grande do Sul tem 23 hidrelétricas construídas na bacia do Uruguai e do Jacuí. As regiões onde essas usinas foram instaladas não se desenvolveram e apresentam elevados níveis de pobreza. O desenvolvimento não chegou nestas comunidades. Temos que questionar também por que o preço da energia é tão caro. Ela é cara porque não é para nós. Entre as usinas de Itá e Machadinho, por exemplo, há problema de falta de energia para a população”, observou. Enquanto isso, acrescentou, grandes empresas como a Tractebel Suez, Votorantim, Alcoa e CPFL, controladoras de usinas que em boa parte foram financiadas pelo BNDES, lucram milhões todos os anos. “A saída não é produzir mais barragens, mas tornar essas usinas estatais e criar um fundo soberano para investir os recursos gerados por elas dentro do país”, defendeu.
Milton Viário, da Federação dos Metalúrgicos do Rio Grande do Sul, destacou o debate da Plataforma Operária e Camponesa, que reúne movimentos sociais e entidades sindicais, para a construção de um projeto energético popular e soberano no Brasil. “O momento político do país ficou um pouco desfavorável para esse debate, mas precisamos ter persistência. O potencial de produção de energia do Brasil é impressionante e está sendo alvo da cobiça de outros países”, disse. Viário lembrou que a lei de partilha do pré-sal, de 2010, e a política de valorização do conteúdo local estão sendo desmontadas pelo governo Temer. “A política de conteúdo local previa que entre 65 e 70% dos componentes (da indústria naval e petrolífera) tinham que ser produzidos dentro do país. Agora, vai cair para 25% e, em alguns casos, para zero”, lamentou.
Diretor do Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS Sindicato), Antonio Lima defendeu a importância de os temas relacionados à política energética começarem a ser discutidos nas escolas desde a infância, por se tratar de uma questão estratégica para o desenvolvimento do país. Ele lembrou que a lei do petróleo de 1953 já garantia a destinação de recursos para a educação. “Infelizmente, o golpe de 1964 acabou extinguindo esses recursos em 1973. Agora, outro golpe está fazendo a mesma coisa”.
Rodrigo Medeiros, da Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares (Renap), lembrou a lista de 16 direitos humanos dos atingidos por barragens que, segundo relatório aprovado em 2010 pela Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, são sistematicamente violados. O primeiro deles é o direito à informação e participação. Essa violação, exemplificou, se expressa em audiências públicas com técnicos que se limitam a fazer propaganda das obras, sem tratar da vida das pessoas que serão atingidas por elas.
Medeiros também criticou a violação dos direitos das comunidades tradicionais e originária e do direito à moradia adequada. “Temos vários casos de obras que são concluídas antes das casas. Removem as pessoas de qualquer jeito para áreas sem estrutura. Além disso, os técnicos não levam em conta o valor sentimental, sagrado e ambiental das áreas atingidas”.
O deputado Catarina Paladini (PSB) anunciou que apresentará na Comissão de Segurança e Serviços Públicos uma proposta para a realização de uma audiência pública na região Norte do Estado, para debater a situação dos atingidos por barragens e os problemas relacionados à atual política energética apontados no encontro.
Fonte: Sul 21