Frente parlamentar ‘pede socorro’ contra sucateamento do Polo Naval de Rio Grande
A Assembleia Legislativa lançou no início da tarde desta terça-feira (18) a Frente Parlamentar em Defesa do Polo Naval de Rio Grande, que tem o objetivo de sensibilizar os governos estadual e federal e frear o desmonte da indústria naval na metade sul do Estado. Proposta pelo deputado Nelsinho Metalúrgico (PT), que será seu presidente, a frente teve o lançamento marcado por um verdadeiro “pedido de socorro” feito por trabalhadores, representantes de universidades e pelo prefeito de Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer (PT), em razão do interrompimento das atividades nos estaleiros locais e consequente demissão de milhares de pessoas com a crise na Petrobras.
“Nós precisamos articular todas as forças políticas, sindicatos, trabalhadores, deputados estaduais, deputados federais, nossos prefeitos, nossas universidades tecnológicas para mobilizar o governo do Estado para salvar o polo naval aqui no Rio Grande do Sul”, disse o deputado Nelsinho. “Todos os relatos que foram dados indicam um total sucateamento desse parque naval na medida em que a Petrobras está retirando as encomendas que havia feito. Quer dizer, se estruturou um imenso parque industrial para dar conta da demanda que a Petrobras havia apresentado e hoje a Petrobras se retira podendo levar ao sucateamento de toda essa tecnologia, estrutura e mão de obra qualificada que nós conseguimos construir nesses últimos 12 anos”.
A frente destacou que, desde o início da política industrial naval do Brasil, na década passada, mais de R$ 15 bilhões foram investidos no Polo Naval de Rio Grande e mais de 24 mil empregos diretos foram gerados, sem falar nos indiretos. O prefeito Lindenmeyer disse que, em determinados momentos, Rio Grande e São José do Norte chegaram a crescer 12% ao ano e gerar de 6 a 7 empregos indiretos, no comércio de bens e serviços, para cada emprego direto.
No entanto, após a crise econômica e os escândalos de corrupção atingirem a Petrobras, grande parte da indústria local está ociosa e conta apenas com três mil trabalhadores ativos. Só em 2016, quatro mil trabalhadores foram demitidos com a transferência da construção da plataforma P-58 para o Espírito Santo. Lindenmeyer questiona o silêncio do governador diante deste quadro. “A sensibilidade que nós temos é que esse silêncio é de quem abdicou dessa indústria”, disse, acrescentando ainda que gostaria de ver o governador José Ivo Sartori (PMDB) na linha de frente da defesa do Polo Naval junto ao governo federal, especialmente pelo fato de ser do mesmo partido que o presidente Michel Temer.
Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Rio Grande, Benito Gonçalves disse que os trabalhadores estão “pedindo socorro” à Assembleia Legislativa diante da situação em que se encontram. “A direção da Petrobras está praticando um crime lesa-pátria. Não há economia que explique o fato de deixar plataformas em fase de finalização e com todo o material disponível paralisadas aqui e licitar no exterior por um valor três vezes maior”, denunciou.
O ato de lançamento foi acompanhado por um grande grupo de sindicalistas e de trabalhadores do Polo Naval.
‘Cavalinho de pau’ na política
Um dos principais alvos das críticas do prefeito e dos trabalhadores é o atual presidente da Petrobras, Pedro Parente. Em entrevista à Rádio Gaúcha no início de abril, Parente afirmou que a política industrial naval brasileira teve resultado “muito ruim” e apontou como justificativa para descontinuar a produção de plataformas em Rio Grande os atrasos nas entregas, especificamente da P-71 – que está paralisada apesar de já ter mais de 50% construída -, além de questionar o papel da Petrobras como instrumento de políticas públicas.
Lindenmeyer classificou a mudança na política industrial naval a partir do governo Temer como “um cavalinho de pau”. “É inadmissível abandonar estruturas prontas, ativos consolidados, equipamentos de última geração e mão de obra qualificada. O Brasil pode mais do que exportar commodities. Pode ter uma política industrial própria”, defendeu.
Ele argumentou que apenas a conclusão da plataforma P-71 poderia gerar cerca de 2,8 mil empregos diretos por um prazo de 16 meses, o que poderia minimizar a situação de trabalhadores e também a crise do comércio local. “Nós temos três grandes estaleiros entre Rio Grande e São José do Norte, são ativos extraordinários, são os maiores do hemisfério sul e, lá dentro, nós temos pelo menos uma plataforma pela metade. Não existe lugar no mundo que essa plataforma possa ser produzida a menor preço do que em Rio Grande, gerando 2,8 mil empregos diretos de forma imediata por 16 meses, fora os empregos indiretos”, afirmou.
O professor Danilo Giroldo, vice-reitor da FURG e diretor-presidente da associação APL (Arranjo Produtivo Local) – que reúne sindicatos de trabalhadores, empresas, universidades, prefeituras e outros segmentos da metade sul em defesa do Polo Naval -, também questiona os argumentos apresentados por Parente. Segundo ele, a atual gestão superdimensiona os problemas com atrasos.
“Se você analisar toda a carteira de obras e plataformas que já foram construídas em Rio Grande, é muito fácil perceber que os atrasos mais substanciais foram localizados em um dos contratos. Ocorreu a integração da P-53, da P-55, da P-58, entregue antes do prazo, da P-63, todas foram comissionados e estão produzindo, batendo recordes de produção. São ativos de alto valor tecnológico, de grande complexidade industrial e que foram construídos lá. Demonstrando que a região tem competência, tanto em qualidade de mão de obra, quanto em estrutura produtiva”, disse.
Ele também defendeu que, apesar de Parente dizer que a Petrobras não tem interesse na P-71, a conclusão da plataforma poderia sim ser benéfica para a empresa, ainda mais quando ela admite que precisará de 19 plataformas até 2021. “Foi dito que a Petrobras não teria interesse na plataforma. Possivelmente não como ativo, por conta do endividamento da empresa, mas do modelo de leasing e afretamento que tem sido defendido, e até de certa forma com correção, ele poderia se enquadrar para terminar a P-71, porque essa plataforma, conforme a gente tem informações do setor, está sendo cotada lá fora”.
Giroldo é mais econômico na projeção de empregos que a plataforma poderia girar – entre 1,5 mil 2 mil, diz -, mas pondera que a sua retomada é uma medida que pode, de imediato, ajudar a minimizar a crise gerada pelo descontinuamento da maior parte das atividades do Polo Naval. Além disso ele defende que a Petrobras sim tem responsabilidade na indução de políticas públicas que geram ao desenvolvimento e que, a indústria naval, ao redor do mundo, mas especialmente na Ásia, é vista como um setor estratégico, porque “geram muito emprego, tem potencial de incremento de renda e transformação socioeconômica e tem conteúdo tecnológico”.
“Tecnicamente, eu não consigo ver embasamento para uma decisão dessa ordem”, diz Giroldo sobre o descontinuamento da indústria naval brasileira. “Infelizmente, no Brasil, a gente tem sucessões de governos, muitas vezes com visões de estado diferente, que prejudicam muito que a gente tenha uma política de longo prazo, que é essencial para a indústria naval. A gente tem políticas centenárias na Ásia, no Japão, que se valem desse conhecimento acumulado. Nós não teremos uma indústria naval competitiva se a gente não tiver conhecimento. É a mesma coisa a Embraer. Se a gente olhasse a Embraer na década de 1970, ela não produzia os aviões de alto conteúdo tecnológico como hoje. Isso não teve a ver com a privatização, teve a ver com a curva de aprendizado da empresa e o domínio que o país passou a ter”.
Também participaram do lançamento da frente os deputados Adão Villaverde (PT), Catarina Paladini (PSB), Tarcísio Zimmermann (PT), Jeferson Fernandes (PT), Pedro Ruas (PSOL), Stela Farias (PT), Zé Nunes (PT), Valdeci Oliveira (PT), Luiz Fernando Mainardi(PT) e o deputado federal Marco Maia (PT).
Fonte: Luís Eduardo Gomes/SUL 21