Ato reúne mais de 80 mil em Porto Alegre e amplia luta em defesa da democracia e contra o golpe
No dia do aniversário de 52 anos do golpe militar de 1964, que levou a uma ditadura de 21 anos que sequestrou, torturou e deixou um rastro de mortes, desaparecimentos e famílias desamparadas, mais de 80 mi pessoas participaram no início da noite desta quinta-feira (31), no centro de Porto Alegre, de nova mobilização em defesa da democracia, da legalidade, dos direitos dos trabalhadores e contra o golpe do impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT).
Organizado em âmbito nacional pela Frente Brasil Popular e pela Frente Brasil Sem Medo, a manifestação começou com uma concentração às 17h, na Esquina Democrática, onde foi realizado depois um grande ato público, que se estendeu até as 20h30, quando teve início uma caminhada pela Avenida Borges Medeiros rumo ao Largo Zumbi dos Palmares.
Houve também atos regionais em várias cidades do interior do Rio Grande do Sul, como Santa Maria, Pelotas, Rio Grande, Passo Fundo, Erechim, Livramento, Ijuí, Santa Rosa e Três Passos, bem como em outros estados e no Distrito Federal, onde ocorreu o maior ato do dia, com a presença do ex-presidente Lula e a participação de mais de 200 mil pessoas.
Três manifestações em menos de 20 dias
Foi a terceira grande manifestação em menos de 20 dias na capital gaúcha. A primeira ocorreu no domingo (13), no Parque da Redenção, com mais de 10 mil pessoas, no mesmo dia em que os golpistas se reuniram no Parcão. E a segunda aconteceu na sexta-feira (18), também na Esquina Democrática, com mais de 50 mil pessoas.
Além de ter sido bem maior do que os eventos anteriores, como mostra a previsão de público dos organizadores, a grande novidade foi a ampliação do palanque, com a presença de dirigentes da Intersindical, setores do PSol e do PDT e representantes do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) e da Andes, que se uniram na defesa da democracia ao lado da CUT, CTB, MST, PT, PCdoB e movimentos sociais.
Não faltaram palavras de ordem para empolgar os participantes, como “não vai ter golpe, vai ter luta”, “a verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura”, “a nossa luta é todo dia, não vai ter golpe, vai ter democracia”, “sou brasileiro, é pra valer, não vou deixar este golpe acontecer”, “golpistas, fascistas, não passarão”, “RBS, pode esperar, que a Zelotes vai te pegar” e “direita recua, o povo tá na rua”.
O ato foi apresentado por três mulheres dirigentes da CUT, CTB e Intersindical. A secretária de finanças da CUT-RS, Vitalina Gonçalves, era uma das mais animadas. Ela costumava perguntar o público: “o que é este impeachment?” E a resposta era uníssona: “golpe”. A dirigente do PCdoB, Abigail Pereira, destacou: “estamos aqui para dizer que a luta pela democracia não foi em vão e para dizer ‘golpe nunca mais’”.
Defesa da democracia
“Muito se falou nessa semana sobre o que é golpe e o que não é golpe. Temos que explicar para a população e esclarecer que o que está em andamento no Brasil é uma tentativa de golpe, sim”, afirmou o presidente da CUT-RS, Claudir Nespolo.
Não existe prova de crime de responsabilidade contra Dilma. Ela está sendo julgada pelas chamadas pedaladas fiscais, um procedimento que nunca foi crime e que já foi utilizado por diversos governantes como, aliás, fez ao final do passado o governador José Ivo Sartori (PMDB) ao pagar o 13º salário aos servidores públicos por meio de empréstimos no Brasil.
Claudir sublinhou os interesses que estão por trás da conspiração que tenta derrubar a presidenta Dilma. “Sabemos que há um núcleo de inteligência nos Estados Unidos. O Lula e a Dilma contrariaram a indústria petroleira, com a política de conteúdo nacional na exploração de petróleo e o sistema de partilha do pré-sal, bem como a indústria armamentista, quando houve a compra de caças da Suécia, e a ganância do capital financeiro internacional”, lembrou. “Eles enlouqueceram”.
O dirigente da CUT-RS observou que “a elite brasileira é subserviente aos interesses dos EUA, além de vagabunda e preguiçosa”. Para ele, “o setor empresarial, acostumado com o lucro fácil, embarcou no golpe, mas nós viemos aqui dizer que nós não vamos deixar que eles derrubem a Dilma porque a democracia é valor fundamental para a classe trabalhadora”.
Ele alertou que os direitos dos trabalhadores estão ameaçados e é preciso derrotar o golpismo. “A Fiesp embarcou no golpe porque eles viram que só vai avançar a terceirização se derrubarem a Dilma”, apontou.
Este impeachment é golpe
O presidente da CTB-RS, Guiomar Vidor, reforçou que o ato de hoje é mais uma demonstração de que este impeachment é golpe. “Eles querem falar que isso está na Constituição Federal, mas não está. Não vai ter golpe. Vamos resistir e melhorar a vida do país, com democracia e inclusão social.”
O presidente do PT-RS, Ary Vanazzi, disse que hoje o Brasil está dividido entre os trabalhadores e os donos dos meios de comunicação. “Estamos construindo a luta para evitar o golpe, mas a RBS vai dizer que somos apenas 10 mil”. Ele destacou que em relação às políticas públicas de inclusão social do governo é hora de aprender com os erros. “Ninguém aqui precisa gostar do PT, tem que gostar é do nosso Brasil.”
Vanazzi destacou que, em poucos dias, a esquerda brasileira realizou belos atos e questionou como um político corrupto como o deputado Eduardo Cunha pode pedir o impeachment da Dilma. Ele criticou o programa de governo do PMDB, chamado “Ponte para o futuro”. Segundo o dirigente petista, “eles falam em enxugar o Estado e isso é retirar recursos do Prouni, do Bolsa Família, do Minha Casa Minha Vida, penalizando a sociedade”.
O dirigente do PT-RS avisou que “eles podem ter a maioria na Câmara, no Senado, mas nós vamos ter a maioria nas ruas”. Vanazzi ainda criticou a grande imprensa e defendeu a regulamentação da mídia no país.
Golpe, nunca mais
A deputada estadual Manuela D’Ávila, do PCdoB, disse que “é bonito ver gente de todos os movimentos”, o que revela que “nós temos algo que nos unifica”. Ela bateu forte nos golpistas. “Não aceitamos que quem perdeu a eleição coloque em risco a democracia brasileira.”
“Quem está de luto são as elites que perderam as eleições e as suas regalias”, frisou Manuela. “Nós somos da turma que luta e usamos esse verbo porque somos as pessoas que sempre defenderam a democracia”, disse. “Nós lembramos a ditadura para que não aconteça de novo”, alertou. “Aqui lutar é amar”, ensinou. “Não vai ter golpe, vai ter muita luta e muito amor”, concluiu a deputada.
A representante do PSol, Berna Menezes, defendeu a democracia e os programas de inclusão social dos governos Lula e Dilma. “O PSol acredita que a saída é pela esquerda. Precisamos mexer na comunicação e fazer uma auditoria da dívida pública do Brasil”, salientou.
Já o representante da Intersindical, Jerônimo Menezes, salientou o absurdo que é ter uma comissão para julgar o impeachment que está “inundada na corrupção”. Ele se manifestou contra o golpe e qualquer política de ataque aos direitos dos trabalhadores. “Queremos mudanças no governo federal, mas essas mudanças têm que ser frutos de reformas, como agrária, política, educacional e habitação, que não virão através de um golpe”, enfatizou.
Legalidade
O prefeito de São João da Urtiga, Ederildo Paparico Bacchi (PDT), disse que “é um trabalhista remanescente dos presidentes Getúlio Vargas e João Goulart. O Jango, e do imortal governador Leonel Brizola”. Ele, que é também vice-presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), recordou o movimento pela legalidade constitucional, liderado por Brizola em 1961.
“Eu tenho certeza que aqui ninguém é favorável à corrupção”, disse Bacchi ao frisar que “Lula e Dilma oportunizaram fazer as investigações”. O prefeito chamou a atenção de que “não podemos apontar o dedo para todo o Judiciário, mas o juiz Sérgio Moro tem se transformado em um inquisitor da Idade Média”.
Derrotar os golpistas
O ministro do Trabalho e da Previdência Social, Miguel Rossetto, destacou que “não há nada que condene a Dilma por corrupção”. Segundo ele, “o governo eleito pelo povo está sendo ameaçado por aqueles golpistas que foram derrotados pelos 54 milhões de votos e que sempre trabalham para inviabilizar o governo e para que não cumprisse os seus compromissos com o povo”.
“Os golpistas não querem assegurar as conquistas do povo, como o Prouni, o Mais Médicos e a valorização do salário mínimo. Nós estamos nas ruas com as nossas esperanças, compartilhando o sonho de uma pátria livre, que ousou ser independente, respeitosa e soberana. Eles conspiram, mas não conhecem o povo brasileiro e sua capacidade de resistência. Eles não passarão e serão derrotados nas ruas”, garantiu o ministro.
“É hora de ampliar e avançar na nossa organização. É hora de falar com os deputados federais para convencê-los a votar contra o impeachment. Não tem nada que comprometa a Dilma. Conquistamos muito nos últimos anos, mas ainda precisamos conquistar muito mais”, concluiu Rossetto
Unidade pela democracia
O vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Giovani Culau, lembrou que a entidade que representa foi perseguida após 1964. “O golpe sequestrou os sonhos da juventude e estudantes foram mortos pela ditadura”, disse. “O que move os golpistas de hoje não é o combate à corrupção, pois, se fosse, estariam atrás do Eduardo Cunha, que, além de corrupto, é machista, retrógrado e LGBTfóbico”, criticou.
“A juventude organizada vai honrar os que tombaram. A nossa unidade é em defesa da democracia e do Brasil e não vai ter golpe”, apontou Giovani.
A representante do movimento negro, Reginete Bispo, destacou que “somos herdeiros da luta de Zumbi dos Palmares, que demos o sangue para ter liberdade”. Ela disse que “pela primeira vez temos um governo que reconheceu que o povo negro tem direito à vida, à terra e à dignidade e, por isso, estamos aqui para garantir a democracia”. Reginete alertou que “não vamos permitir retrocessos”
Defesa do Estado Democrático de Direito
Antes do final, João Goulart Neto, neto de Jango, recordou as reformas de base defendidas pelo presidente deposto pelos militares em 1964 e destacou a necessidade de “reafirmar a luta pelo Estado Democrático de Direito”.
O representante Mário Madureira, do movimento Advogados e Advogadas pela Legalidade Democrática, lembrou que a OAB envergonhou os profissionais do Direito ao apoiar a ditadura em 1964 e, como se não bastasse, o atual presidente Cláudio Lamachia apresentou na segunda-feira (28) um novo pedido de impeachment, o que motivou protestos de advogados na própria Câmara e em frente à sede estadual em Porto Alegre.
Os participantes do ato também ficaram indignados e adaptaram a palavra de ordem, que já é marca registrada de protesto contra a Globo, e entoaram: “a verdade é dura, a OAB apoiou a ditadura”. Para Madureira, que reforçou a defesa do Estado Democrático de Direito, “essas decisões da OAB não nos representam e vamos lutar contra elas”.
Durante a caminhada até o Largo Zumbi dos Palmares, não faltaram pessoas que se manifestaram com gestos nas janelas dos edifícios e muitas colocaram panos ou bandeiras vermelhas, simbolizando unidade com o movimento e força na luta contra o golpe.
Fonte: CUT-RS com Sul21