Trabalho em regime de zero hora abre polêmica no Reino Unido
LONDRES — Há quase um semestre trabalhando num pequeno escritório de advocacia na Zona Oeste da capital britânica, a secretária Katherine Mavti agora se sente mais segura, pois sabe exatamente quanto receberá no fim do mês. Até há pouco tempo, ela era funcionária de uma grande rede de fast-food e só ganhava quando era chamada para trabalhar. Katherine fazia parte do universo de cerca de um milhão de trabalhadores que podem estar sob o regime de contrato de zero hora no Reino Unido.
O dado veio a público a partir de um estudo do Chartered Institute of Personnel Development (CIPD) e desafia as estatísticas oficiais — de acordo com elas, são apenas 250 mil pessoas nesta situação. Pelo estudo, um em cada cinco empregados das mil companhias ouvidas está submetido a este tipo de contrato. O regime funciona basicamente assim: você está disponível para a empresa, mas só recebe pelas horas efetivamente trabalhadas.
— Eles costumavam informar a agenda da semana em cima da hora. Não conseguia levar uma vida normal. Trabalhava até 39 horas por mês, mas tudo dependia do movimento. Não sabia quanto teria para pagar meu aluguel. Às vezes, precisava antecipar uns dias de férias para honrar minhas despesas do período — conta Katherine.
Especialista pondera que estatística oficial é obtida junto a universo maior
Os setores em que os empregadores mais admitem contratar ao menos um funcionário pelo regime de zero hora, segundo o CIPD, são o de hotéis, alimentação e lazer (48%), educação (35%) e saúde (27%).
O McDonald´s, que emprega 92 mil pessoas em 1.200 restaurantes no Reino Unido, admitiu que 90% do seus trabalhadores no país recebem por hora. A assessoria de imprensa da rede garante, porém, que os funcionários têm acesso a todos os benefícios, como férias e seguro de vida, e não são obrigados a estar à disposição da empresa.
— Muitos dos nossos empregados são pais ou estudantes que precisam de flexibilidade, por querer um trabalho remunerado compatível com a criação dos filhos, estudos ou outros compromissos — disse um porta-voz.
O analista de mercado e trabalho do CIPD, Gerwin Davies, diz que o aumento dos contratos de zero hora é um fenômeno cíclico.
— É uma resposta às incertezas e às reduções de custos. Mas não deixa de ser uma conveniência para empregados e patrões.
Para Johnatan Wadsworth, especialista da London School of Economics (LSE), é preciso cuidado com os dados: os do CIPD se baseiam em pesquisas com mil empresas, e os oficiais, em entrevistas com 60 mil pessoas.
O secretário de Negócios, Vince Cable, diz que “é importante que a mão de obra continue flexível” e “é igualmente importante que seja tratada com justiça”. O governo deve se posicionar sobre o tema até setembro. Os sindicatos condenaram o regime.
Fonte: Jornal O Globo