Seminário defende Reforma Tributária como pauta central dos trabalhadores

ROBERTO PARIZOTTI (SAPÃO)
Seminário defende Reforma Tributária como pauta central dos trabalhadores

“Quando uma pessoa toma uma vacina, ou precisa de um remédio de ponta para o tratamento de câncer, ela está usando o SUS. O Brasil é um país onde o povo precisa ser financiado. Não existe país sem Estado, e todas as pessoas, de todas as classes sociais, se beneficiam das políticas públicas. É preciso, antes de mais nada, enterrar a ideia de que imposto é gasto; é um dinheiro que some. Isso não existe.”

A fala contundente é de Fausto Augusto Jr, diretor técnico do Dieese, e encerrou o seminário Reforma Tributária para um Brasil Socialmente Justo, promovido pelo Sindifisco Nacional em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Instituto Justiça Fiscal (IJF).

As distorções do sistema tributário brasileiro foram os pontos centrais dos debates, que ocorreram nesta quinta-feira, 28, em São Paulo. Além de um modelo de tributação que efetivamente financie o Estado, a reforma como agenda da classe trabalhadora foi endereçada pela vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira. “Não começamos a discutir esse tema agora. Há um conjunto de forças populares debatendo a Reforma Tributária há muito tempo. Agora precisamos ser uma força capaz de dialogar com o governo.”

No primeiro painel, o presidente do IJF, Dão Real Pereira dos Santos, reforçou o que deve ser prioridade dentro do tema.“O que queremos fazer é um instrumento que viabilize o estado de bem estar e social e que trabalhe não no sentido oposto aos princípios constitucionais, mas no sentido da construção de uma sociedade solidária”, disse.

Já a secretária-adjunta de Finanças da CUT, Maria Faria, também presidenta do Dieese, ressaltou que a apropriação do debate da Reforma Tributária pela classe trabalhadora “significa discutir inclusão, cidadania e recursos para as políticas públicas que garantam qualidade de vida das pessoas.”

“O Dieese atua junto a entidades sindicais no diálogo com a sociedade para que as pessoas compreendam o impacto da tributação na vida de cada um. E a partir disso, podemos discutir uma reforma justa”, completou a dirigente.

O seminário teve como fio condutor as principais defesas do movimento sindical e movimentos populares, que giram em torno da progressividade tributária no país. O primeiro argumento é o de que a atual lógica de tributação sobre o consumo seja alterada para a lógica de tributação de patrimônio e renda, o que inclui taxar grandes fortunas e os super-ricos.

Ainda na abertura, o presidente do Sindifisco Nacional, Isac Falcão, também reforçou o necessário protagonismo da classe trabalhadora no debate da reforma. “Líderes sindicais patronais abriram o debate da Reforma Tributária. Isso é lamentável. Por isso, os sindicatos dos trabalhadores precisam fazer a discussão, caso contrário, permanece o quadro em o rendimento do trabalho é tributado, mas o do capital não”, disse Falcão.

Por uma reforma que financie o povo
Ainda no primeiro painel, sobre o tema da desigualdade social como consequência da tributação injusta no país, a pesquisadora do Cesit/Unicamp Marilane Teixeira afirmou que é preciso entender que a tributação, em qualquer sociedade, é fundamental para manter as políticas públicas e para manter o papel constitucional do Estado.

“Dinheiro não dá em árvore e o Banco Central não emite moeda. Portanto, para financiar políticas públicas, tem que arrecadar. O recurso tem que sair de algum lugar”, lembrou a pesquisadora.

Marilane ainda ressaltou que a reforma deve ser capaz de garantir essas políticas a fim de corrigir distorções sociais no país. “Em uma sociedade capitalista, extremamente desigual como no Brasil, a forma de mitigar as distorções é por meio de políticas públicas e o Estado tem papel fundamental.”

O papel dos movimentos populares
A linha de pensamento comum a todos os especialistas que participaram do seminário é a de que a classe trabalhadora precisa entender não só o que é o sistema tributário brasileiro atual, mas também entender o que precisa ser feito, ou qual o modelo de tributação ideal para o país.

“Essas reformas teriam sido piores se não fosse o movimento sindical ter mobilizado a sociedade. O que movimenta esse seminário é a necessidade de os movimentos populares dominarem o tema”, disse Fausto, do Dieese.

Fausto explicou ainda que o sistema atual é regressivo, complexo e pouco transparente, e que debater arrecadação e a distribuição é debater caminhos para um país justo e solidário.

Na conta da justiça social, o mais importante, segundo o técnico do Dieese, não é o número de impostos, ideia amplamente difundida no senso comum, “mas a quantidade de regimes especiais, exceções e incentivos fiscais, que contribuem para a distorção do sistema tributário brasileiro cuja carga maior recai sobre os mais pobres.”

Receita neoliberal de desigualdades
O economista e presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Marcio Pochman, apontou, a partir da análise da situação econômica do Brasil ao longo dos anos, que o atual sistema tributário é resultado de um receituário neoliberal de desigualdade.

“O que temos de tributação é extremamente funcional ao capitalismo. Tem tido papel importante na justificativa de um país que está praticamente há quatro décadas em regime de semi-estagnação de renda per capita”, afirmou.

O economista explicou ainda que, do outro lado, essa funcionalidade está associada ao aumento de super-ricos, “A renda per capita fica estabilizada ao mesmo tempo em que aumenta o número de super-ricos”, disse.

Para ele, a Reforma Tributária deve também ser justa, aliviando a carga de impostos para os mais pobres e aumentando a carga para os mais ricos, em especial para os super-ricos, detentores de grandes fortunas “e que quase nada pagam de impostos”.

Por fim, o economista José Dari, da Unicamp, chamou atenção para a importância do trabalho como dimensão central da vida. Para Dari, a ideia de uma renda universal, por exemplo, não dá conta das funções e aspirações sociais dos indivíduos, e alertou ainda para o fato de que com as novas formas de trabalho, desemprego e precarização, “é difícil falar em impostos e formas de financiar seguridade social. Por isso, é preciso fortalecer a agenda do trabalho como um todo.”

Fonte: CUT Nacional

Pesquisar

FTMRS