Que banho de água fria

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Que banho de água fria

No artigo "Qual será o ritmo de expansão em 2019?" publicado pelo Valor no último dia 28, os economistas Maurício Furtado e Gilberto Borça Jr, com muito realismo, dão um tremendo banho de água fria em Homer Cado e seus arautos na “mídia especializada”. Fatos – e não “expectativas”, o nome que o liberalismo resolveu dar à fé religiosa – são a marca do texto, cujos pontos de destaque seguem copiados abaixo:

“No curto prazo, supondo certa rigidez de preços, sabe-se que a dinâmica da economia é determinada primordialmente pelos componentes da demanda agregada - consumo das famílias, investimentos, gastos do governo, exportações e importações -, os quais, por sua vez, podem ser classificados em gastos induzidos ou autônomos.

Os gastos induzidos são aqueles que vão a reboque da atividade econômica, normalmente associados à renda corrente disponível. (...) Os gastos autônomos, por outro lado, são pouco influenciados pelo desempenho corrente da atividade, apresentando dinâmica própria. No caso dos gastos privados, estão associados à riqueza dos agentes, bem como às condições financeiras e de crédito da economia. Isso significa que, dentro desse arcabouço, o desempenho da economia no curto prazo é determinado pelos gastos autônomos. Os gastos autônomos incluem: o consumo de produtos duráveis; investimentos em construção; os gastos do governo; e as exportações de bens e serviços. Para endereçar minimamente a pergunta do título do artigo é necessário explorar, portanto, quais são as perspectivas de cada um deles em 2019.

O consumo de duráveis guarda uma forte relação com as condições de crédito às pessoas físicas. Um primeiro olhar menos atento poderia argumentar que houve aceleração das concessões reais de crédito livre para pessoas físicas em 2018, e que esse processo poderia perdurar em 2019. Embora a aceleração do crédito em bases anuais tenha, de fato, ocorrido, o gráfico aponta que tanto sua trajetória de crescimento em 12 meses, quanto à do consumo de duráveis foi de desaceleração a partir de meados de 2018. Como uma inflexão desse processo é pouco provável, tal fato tende a limitar o impacto do consumo de duráveis como variável autônoma de aceleração da atividade em 2019.

O investimento em construção permanece em situação delicada. Trata-se do setor mais atingido pela recessão brasileira de 2015 e 2016, com encolhimento acumulado de 30% entre o começo de 2014 e o final de 2018, e destruição líquida de mais de 1 milhão de postos de trabalho. Embora seja possível observar alguma melhora no setor habitacional, com aceleração de lançamentos de novas unidades e reduções nos números de distratos, o fato é que o setor de construção pesada ainda enfrenta restrições severas, tanto pelo lado da demanda - pois os investimentos públicos se encontram em seus patamares mínimos devido à crise fiscal - quanto pelo lado da oferta - em que as grandes construtoras ainda estão às voltas com seus acordos de leniência devido à Operação Lava-Jato.

As exportações, embora tenham apresentado comportamento dinâmico entre 2017 e meados de 2018, passaram a ser impactadas pela atual conjuntura internacional adversa. As revisões para baixo das expectativas de crescimento mundial, bem como os potenciais efeitos de uma escalada da guerra comercial entre EUA e China demandam cautela em relação às perspectivas para as exportações brasileiras em 2019. Além disso, a crise argentina, ocorrida em meados de 2018, também é um fator contrário à retomada de um ritmo mais intenso das vendas externas. Dessa forma, caso venha a ocorrer, a aceleração das exportações deve ser bastante limitada ao longo de 2019.

Os gastos do governo, mensurados pelas despesas do governo central, apresentaram, entre 1997 e 2015, crescimento real de 6% ao ano. Desde então há forte inflexão. Entre 2016 e 2018 os gastos permaneceram praticamente estagnados. Em vista da atual situação fiscal do Estado brasileiro é pouco provável que o cenário de baixo crescimento dos gastos do governo seja revertido em 2019, mesmo com alguma folga no teto de gastos. Dessa forma, o impulso fiscal para a atividade econômica tende a continuar no território neutro/negativo.

Resumidamente, todos os componentes autônomos da demanda agregada, que têm capacidade de liderar o crescimento no curto prazo, não apresentam, por ora, qualquer dinâmica de aceleração clara. Na verdade, os dados indicam que os gastos autônomos perderam tração na segunda metade de 2018, revertendo o processo que se iniciou em 2017.

Diante das limitações dos componentes autônomos da demanda agregada, a tendência é que a atividade econômica acelere pouco em 2019, situando-se, provavelmente, abaixo dos 2%, e não em 2,5% como indicado pela mediana das projeções de mercado.”

Acesse o artigo aqui: https://www.valor.com.br/opiniao/6141519/qual-sera-o-ritmo-de-expansao-em-2019

 

Fonte: Valor

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