Para economistas, independência do BC levaria ao desemprego e concentraria renda

Proposta é defendida por algumas candidaturas e bancos privados, que querem aumento de juros, redução de salário e de emprego para conter inflação e concentrar renda.

A independência do Banco Central, defendida pelos bancos privados e pelos candidatos Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB), é um risco na opinião de Pedro Rossi e Pedro Paulo Zahluth Bastos, economistas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“O maior risco é que Banco Central seja capturado por determinados interesses, especialmente pelo mercado financeiro”, explica. Para Rossi, o Banco Central já possui certa autonomia: “Ele dialoga com o mercado de forma geral. Tem autonomia, na prática, mas está vinculado às instituições democráticas”.

A lógica do mercado financeiro é que o pleno emprego, alto consumo e salário aumentam a inflação. Com um Banco Central independente, em que possa definir a política econômica do país sem intervenção do Estado, o desenvolvimento social seria diretamente afetado. Hoje a inflação está no teto da meta definido pelo governo. “O perigoso é tentar colocá-la no centro da meta à qualquer custo e isso pode incidir em desemprego”, explica Rossi.

O governo de Dilma e Lula apostaram no crescimento da economia com distribuição de renda e valorização do salário mínimo, com ganhos reais de compra.

Com essa política econômica o Brasil reduziu a probreza e aumentou o emprego, mantendo a economia dentro da meta de inflação. Rossi ainda defende que o Banco Central deveria estar vinculado ainda mais ao governo: “No Estados Unidos, por exemplo, o Federal Reserve (equivalente ao Banco Central) deve prestar contas ao Congresso. Aqui, não”.

Para Pedro Paulo Zahluth Bastos, o BC tem autonomia operacional, tanto que aumenta os juros desde 2013, num cenário de elevação de custos provocada por depreciação cambial e choque agrícola, fazendo exatamente como o mercado financeiro pedia. “Pessoalmente, acho que Alexandre Tombini (presidente do BC) é relativamente conservador, a ponto de também ser responsável pela forte desaceleração que tivemos em um momento de grande concorrência internacional e de desaceleração cíclica do consumo de bens duráveis”, avalia. “Dizer que isso é bom para o governo Dilma, em um período eleitoral, é um completo disparate”.

Bastos diz que os conservadores que propõem o BC independente porque querem muito mais desemprego e desaceleração, para que os salários caiam e a distribuição de renda piore.”É exatamente isso que querem os que propõem o Banco Central independente: gerar desemprego para assegurar a estabilidade de preços”, diz. Segundo ele, a solução conservadora não é unânime entre os economistas. Há uma corrente acadêmica que comprova com dados que a inflação no Brasil resulta, sobretudo, de choques de custos, que são independentes do nível de atividade.

“É claro que uma economia muito aquecida pode ter mais gargalos de oferta, mas hoje os conservadores já dizem que o crescimento potencial (máximo) da economia teria caído para 1,5% do PIB! Ou seja, mais do que isso, teríamos pressão inflacionária que deveria ser contida com aumento do desemprego”, diz ele.

Bastos ressalta a incoerência dos candidatos de oposição, que defendem o BC independente para agradar o mercado financeiro e distribuição de renda e valorização do salário mínimo para ganhar votos. Essa seria uma política contraditória: “A conta não fecha!”

Ele cita também as políticas anticíclicas adotadas pelo governo Dilma que vão contra os interesses do mercado financeiro, como os incentivos seletivos aos investimentos para superar gargalos específicos de oferta e reduções compensatórias de alguns preços administrados ou custos tributários. “Defendem, por exemplo, elevação de preços de energia elétrica e petróleo, ou seja, que não haja qualquer administração compensatória de preços mesmo em momento de choque agrícola e desvalorização cambial, alegando que a elevação de juros e o corte do gasto público devem ‘compensar’ sozinhos o impacto dos choques”, diz.

Como Rossi, Bastos lembra que, nos Estados Unidos, o Federal Reserve é obrigado por lei a equilibrar máximo emprego, estabilidade de preços, e taxas de juros moderadas a longo prazo. “No Brasil, contudo, os defensores de ideia consideram que não é possível conciliar máximo emprego e estabilidade de preços”.

Além de provocar desemprego, uma taxa de juros alta afeta o orçamento de quem tem dívidas e dificulta o crédito para comprar casas ou carros. “Também aumentaria a dívida pública e seu custo anual, o que poderia levar os conservadores a exigirem cortes de gasto social, como fazem na Europa hoje”. Os juros altos são bons para a especulação porque atrai capitais estrangeiros interessados nos ganhos fáceis, o que encarece o Real e retira empregos dos setores exportadores ou que concorram com importações, independentemente de sua eficiência produtiva. “Torna-se um ciclo vicioso: sem mercados em crescimento, as empresas não investiriam muito, o que manteria o produto potencial baixo e o desemprego alto, por muito tempo”.

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O Banco Central virou tema central no debate eleitoral. De um lado, a presidenta Dilma Rousseff defende a manutenção do modo atual; de outro, Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (PSB) quer a autonomia.

Criado em 1964, o Banco Central é um órgão vinculado ao Ministério da Fazenda e tem, entre outras competências, a responsabilidade pelo sistema financeiro e de atuar na preservação do valor da moeda. Atualmente, o presidente do BC é nomeado pelo presidente da República. É o governo que supervisiona a execução do órgão e define as prioridades da economia nacional. Ou seja, é o eleito pela população que cuida da economia do país.

Um banco independente é um mercado que se autorregula, define e decide a política monetária e os rumos que a economia do país deve seguir. Para os economistas da Unicamp, é importante diferenciar autonomia de independência. Um BC autônomo pode, por exemplo, possuir mandatos estáveis para a diretoria e o Poder Executivo não pode destitui-lo; porém, estaria subordinado à Presidência nas definições da política monetária. A independência daria ao Banco Central a possibilidade de tomar decisões sem consultar o Poder Executivo.

Aécio Neves defende uma autonomia formal, garantida por meio de uma resolução presidencial, que determine ao BC a missão de controlar a moeda, a inflação e de manter saudável o sistema financeiro.

Marina Silva é mais contundente. A proposta é, de acordo com seu programa de governo: “Assegurar a independência do Banco Central o mais rapidamente possível, de forma institucional, para que ele possa praticar a política monetária necessária ao controle da inflação”.

Para o presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM/CUT), Paulo Cayres, dar independência ao Banco Central é o mesmo que "colocar a raposa para tomar conta do galinheiro". O sindicalista exemplifica que, no caso da candidata do PSB, claramente os bancos privados estariam à frente do modelo econômico do País. "É bom lembrar que a coordenação da campanha da Marina é feita pela dona do banco Itaú. Já no caso do Aécio, o modelo que ele defende não é muito diferente. Ou seja, tudo o que avançamos no que se refere à redução da desigualdade, ao pleno emprego e ao aumento da renda do trabalhador pode ir por terra", considera Cayres.

(Confira também aqui artigo sobre o assunto, de autoria de Carlos Cordeiro, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro da CUT)

Fonte: Aline Baeza - Agência PT de Notícias

 

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