Negros são 2,5 vezes mais vítimas de armas de fogo do que brancos no Brasil

Maioria na população brasileira, os negros também são as principais vítimas das mortes provocadas por arma de fogo no país, conforme levantamento mais recente do Mapa da Violência 2015, que será divulgado hoje (14), em Brasília. Das 39.686 vítimas de disparo de qualquer tipo de arma de fogo, em 2012, 28.946 eram negros e 10.632, brancos – a diferença nos números mostra que as vítimas desse tipo de morte foram 2,5 vezes mais de negros do que de brancos. Para cada grupo de 100 mil habitantes, a taxa de vítimas da cor branca ficou em 11,8 óbitos, enquanto a de negros registrou 28,5 mortes para cada 100 mil habitantes, diferença de 142%.

O levantamento usa dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, que registra as declarações de óbito expedidas em todo o país. Para o determinar o recorte racial das vítimas de armas de fogo, o estudo considera as opções dadas pelos entrevistados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – branca, preta, parda, amarela ou indígena – na elaboração dos censos demográficos. Enquanto a série histórica do Mapa da Violência compreende o intervalado entre 1980 e 2012, a classificação das mortes por arma de fogo conforme a cor da pele é feita desde 2002.

Na comparação por unidades da Federação, Alagoas e Paraíba destacam-se pela "seletividade racial" nos homicídios por arma de fogo. Nesses locais, a diferença superou 1.000%. “Para cada branco vítima de arma de fogo nesses estados, morrem proporcionalmente mais de 10 negros, vítimas de homicídio intencional”, informa trecho do levantamento. “Não preocupa só a trágica seletividade de negros e de jovens nesses homicídios, incomoda muito mais verificar a tendência crescente dessa seletividade ao longo dos últimos anos”, destaca o documento. Das 27 unidades federativas, de acordo com o Mapa da Violência 2015, apenas no Paraná o número de brancos vítimas de armas de fogo é maior do que o de negros.

Para o autor do Mapa da Violência, Julio Jacobo Waiselfisz, a prevalência das mortes violentas da população negra está relacionada à falta de políticas públicas de proteção dessa parcela da população e ao recrudescimento das políticas de desarmamento. “[A morte de jovens negros] está associada a várias coisas, à falta de políticas públicas de proteção da população, que são direcionadas aqueles setores mais ricos que são, majoritariamente, brancos. Ali tem mais policiamento, mais proteção, enquanto nos bairro nos bairros das periferias urbanas não têm segurança pública nem privada. É um salve-se quem puder”, disse o sociólogo à Agência Brasil.

Conforme mostra o Mapa da Violência, enquanto as taxas de homicídios de brancos por arma de fogo caíram de 14,5 para 11,8 em 100 mil brancos, entre 2003 e 2012, os números em relação aos negros no mesmo período subiram de 24,9 para 28,5. “Com esse ritmo marcadamente diferencial, a vitimização negra do país, que em 2003 era de 72,5%, em poucos anos duplica: em 2012 já é de 142%”, destaca o levantamento, elaborado pela Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais (FLACSO), em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil.

“São jovens pobre, negros, da periferia urbanas, sujeitos ao arbítrio das polícias, das balas perdidas entre traficantes ou a eles mesmos, em uma das poucas alternativas de trabalho e ocupação que é o próprio tráfico de drogas. Há uma constelação de fatores que está levando que nossa juventude, a juventude negra seja um material de consumo dessa chacina”, disse o sociólogo.

Cotas e o fim da violência
Entidades da sociedade civil fizeram nesta quarta-feira (13) uma manifestação no Largo da Batata, em São Paulo, pedindo a adoção de cotas para negros no ingresso nas universidades públicas e o fim dos assassinatos contra jovens negros das periferias das cidades.

“O movimento negro está na rua hoje, dia 13 de Maio, dia da falsa abolição da escravatura, para denunciar que a abolição não ocorreu. Viemos pedir cotas e denunciar também o genocídio da população negra que segue até hoje”, disse Gabriela Mendes Chaves, do Levante Popular da Juventude.

Gabriela, que é universitária no curso de economia na Pontifícia Universidade Católica (PUC), disse que só consegue se manter na faculdade porque foi selecionada via cotas para receber recursos do Programa Universidade para Todos (Prouni).

“O Prouni tem uma porcentagem para cotas para negros e foi assim que eu consegui entrar na PUC. A mensalidade lá é R$ 1.900 e, se não fosse o programa, não teria condições nenhuma de frequentar uma universidade como aquela. Como a maioria dos negros não consegue”, disse.

O grupo, que se reuniu no início da noite no Largo da Batata, na zona oeste da capital, partiu em passeata até o Portão 1 da Universidade de São Paulo (USP). A polícia e os organizadores não tinham uma estimativa do número de pessoas que participaram do ato.

“O nosso foco para a implementação das cotas é as universidades públicas. Eu acho que a gente ocupando as universidades públicas, estando lá dentro, a gente é capaz de mudar a realidade”, disse a vestibulanda Jenifer Rodrigues Lopes, do Núcleo de Consciência Negra da USP.

Fonte: Ivan Richard e Bruno Bocchini, da Agência Brasil

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