Empresas demitem trabalhadores por justa causa por uso celular

Agência Brasil
Empresas demitem trabalhadores por justa causa por uso celular

Recentes decisões da Justiça do Trabalho têm confirmado demissões por justa causa, portanto, sem direitos rescisórios, de trabalhadores dispensados pelo uso excessivo do celular em horário de trabalho, apesar da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não citar o uso do aparelho que nem existia quando a lei foi criada.

Demissão por justa causa pelo simples fato de o trabalhador, em determinado momento, ‘pegar’ no celular, “é abusiva”, afirma o advogado especialista em Direito do Trabalho José Eymard Loguércio.

Esse abuso está se tornando comum no Brasil. Tramitam na Justiça do Trabalho do país, atualmente, cerca de 47 mil processos de demissões por justa causa pelo uso do celular, de acordo com o jornal Valor Econômico.

Para o advogado Eymard Loguércio, que é assessor jurídico da CUT Nacional, trabalhadores precisam ter bom senso e empresários precisam discutir relações de trabalho antes de decisões como essas.

“É fato que deve haver bom senso por parte do trabalhador quanto ao uso pessoal do celular em horário de trabalho. Inclusive, respeitando eventuais regras da empresa, mas casos de dispensa por justa causa fundadas nessa questão são exageradas. Em geral, a empresa tem que discutir a política de relação e trabalho, inclusive em acordos coletivos, com participação dos sindicatos”, diz o advogado.

O tema é uma ‘novidade’ nas relações de trabalho que, diz o advogado, e as decisões dos empregadores são fundadas em um certo autoritarismo no Brasil. “É um dos temas que apareceram nos últimos anos e outros virão e não há nada que trate dessas questões na legislação. O que acontece é que temos uma tradição no mundo do trabalho em que o empregador exerce um poder de controle sobre os trabalhadores”, diz.

E o Direito do Trabalho, prossegue Eymard, tem tentado exercer um papel de equilibrar essas relações para que os trabalhadores não fiquem absolutamente vulneráveis às condutas autoritárias dos patrões.

Afinal, o que diz a CLT?
A CLT não prevê especificamente a demissão sem direito no caso do uso do celular, mas há regras sobre a demissão por justa causa e elas devem ser observadas, afirma Eymard Loguércio.

“A CLT reza que a justa causa só possa ocorrer em casos específicos como indisciplina, ingerência, entre outros, mas exige prévio acompanhamento como advertências e reiteração da punição”, explica o advogado.

Um dos itens relacionados no Artigo 482° da CLT como motivos para justa causa é a insubordinação. Neste caso, explica Eymard, pode se considerar a demissão desta forma como correta, já que o trabalhador foi advertido previamente e ainda assim manteve sua conduta.

“Ninguém pode ser demitido por justa causa apenas pelo uso, somente quando houver abuso e que haja um histórico de advertências”, reforça o advogado.

No entanto, algumas decisões da Justiça têm caminhado em sentido contrário o que, para Eymard Loguércio mostra que a Justiça do Trabalho, em certo ponto, reproduz os conceitos conservadores e autoritários característicos das relações de trabalho no Brasil.

Ele alerta que é necessário analisar caso a caso para se ter um parâmetro exato da chamada ‘jurisprudência’, ou seja, decisões que servem de base para futuros entendimentos jurídicos, no caso, tornar ‘padrão’ a decisão de julgar a favor das empresas nesses casos.

O advogado avalia ainda que é cedo para se ter o conceito de que há, de fato, uma jurisprudência em relação ao ganho de causa das empresas em ações movidas para reversão da demissão por justa causa. “Não há um número consistente de decisões da Justiça que possam configurar uma real jurisprudência”.

Direitos do trabalhador
O secretário de Relações do Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento, também considera a demissão por justa causa por uso de celular abusiva. Para ele, antes de tomar decisões como essa as empresas têm de levar em consideração outros fatores, entre eles o fato de que a nossa sociedade está em constante mudança no que diz respeito aos hábitos.

“Todos sabemos que o celular é como se fosse uma extensão de nossas vidas. Somos dependentes das tecnologias e facilidades que ele nos oferece, seja para comunicação ou para serviços. Temos tudo à mão, no celular”, ele diz.

Apesar disso, ele concorda que deve haver um bom senso por ambas as partes no que diz respeito à moderação do uso. “O trabalho requer concentração, mas daí a impedir que trabalhadores possam até portar o celular é exagero”, diz se referindo a casos de empresas que exigem que os funcionários deixem seus aparelhos em locais específicos, longe, por exemplo, da mesa de trabalho.

Na questão de relações de trabalho, Ari aponta ainda que se há regras, elas devem ser discutidas com os trabalhadores, por meio de diálogo e compreensão para haja um ambiente saudável de trabalho. “Qualquer medida de punição sem esse caminho, é autoritarismo”, diz.

Assim como Eymard Loguércio, Ari também acredita que o tema deva ser incluído em negociações e acordos coletivos para que, já que não há uma regulação oficial, regras sejam combinadas a fim de proteger os direitos dos trabalhadores.

“É um bom espaço para os sindicatos, nas negociações, introduzirem a questão como tema de modo a não impedir o uso, mas tratá-lo com bom senso para que não haja abuso, nem do trabalhador nem da empresa”, pontua Eymard.

Direitos do trabalhador demitido por justa causa
Trabalhadores demitidos por justa causa perdem os direitos trabalhistas que seriam pagos se a dispensa fosse sem justa causa, mas alguns direitos estão garantidos. São eles:

- Saldo de salários;

- Férias vencidas, com acréscimo de 1/3 de férias, confome CLT;

- Salário-família (quando for o caso);

- Horas extras realizadas ou pagamento de saldo de banco de horas;

- Depósito do FGTS do mês anterior e/ou do mês da rescisão.

Direitos perdidos:

- 13º salário proporcional;

- férias proporcionais acrescidas de 1/3 constitucional;

- multa de 40% sobre o saldo do FGTS;

- guias para receber o saldo do FGTS depositado e para parcelas do seguro desemprego.

Em caso de dúvidas sobre a demissão, o trabalhador deve procurar orientação jurídica em seu sindicato.

Fonte: CUT Nacional

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