Em troca de mudança na Previdência, governo propõe aumento de benefícios a militares
Para economista, proposta revela que discurso de tratamento igualitário a setores sociais é falso
Para começar a análise do projeto de reforma da Previdência Social, uma das condições dadas ao governo pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara dos Deputados foi a reforma do sistema previdenciário dos militares. No entanto, ela economizará menos do que se previa. Isso porque, junto com a proposta, o governo apresentou um plano de reestruturação da carreira militar que, na prática, devolve aos militares, principalmente os de mais alta patente, o recurso descontado para o sistema de previdência.
A estimativa é que o governo economize R$ 97,3 bilhões em dez anos com as mudanças no sistema de proteção social dos militares das Forças Armadas, como é conhecido o sistema de previdência deles. Por outro lado, a reestruturação vai significar uma despesa de R$ 86,85 bilhões no mesmo período, ou seja, o corte de gastos será de R$ 10,45 bilhões em uma década.
Para o economista Guilherme Mello, a economia feita pela reforma da previdência dos militares será “ínfima”, se comparada ao valor da economia pretendida com o todo o sistema geral de previdência social.
“O governo é um governo de militares para militares. E o que eles fizeram foi atender a uma demanda antiga, aumentando os soldos em até mais de 30%. E com isso geraram uma despesa extra. E compensaram aumentando um pouco o tempo de contribuição, um pouco a alíquota de contribuição. E com isso gerou uma economia de R$ 10 bilhões ao longo de 10 anos. Essa economia de R$10 bilhões não é nem 1% da economia de R$ 1 trilhão que estava prevista. Então quer dizer, a contribuição dos militares vai ser ínfima”.
Soldo é o valor que o militar recebe pelo posto que ocupa, sem incluir as gratificações. Ao todo, o governo espera economizar cerca de R$ 1,05 trilhão em 10 anos com a reforma da Previdência, o que significa que a economia de gastos com a previdência dos militares representa apenas 0,99% da economia total promovida pela reforma. Segundo Mello, isso revela que o discurso de tratamento igualitário aos setores sociais na reforma previdenciária é falso.
“Quando você olha a composição da tal da economia, percebe que é uma economia em cima dos mais pobres. Isso poderia ser parcialmente revertido com a reforma dos militares. Porque os militares se aposentam com integralidade, ou seja, recebe o mesmo salário do último cargo da ativa e, se você olha o déficit que os militares gera, é mais da metade do déficit dos servidores públicos como um todo”, explica.
Alterações no plano de carreira
Caso o projeto seja aprovado no Congresso, os militares passarão a receber um “adicional de disponibilidade permanente”, que vai variar de 5% a 32% dos salários, sendo que os valores mais elevados serão destinados aos níveis mais altos da hierarquia. Ainda segundo o projeto, os militares poderão incrementar os salários após a realização de cursos de aprimoramento.
A título de exemplo, hoje, um militar que conclui um curso de doutorado recebe um adicional de 30% do salário. Com a mudança, esse percentual passa a 73%.
Somadas as gratificações atuais, os salários de generais, almirantes e tenentes-brigadeiros chegam a R$ 22.631,28. Com a proposta de reestruturação, devem subir para R$ 30.175,04, o que representa um aumento de 33,33%.
Outra medida que vai onerar ainda mais os cofres públicos diz respeito aos militares na reserva. Atualmente, quando o militar se retira da ativa, deixa de receber um benefício de 10% sobre o salário. Com a alteração, esse benefício será mantido para os inativos.
O projeto de reforma do sistema de previdência dos militares foi entregue ao Congresso Nacional na última quarta-feira (20) pelo próprio presidente da República, Jair Bolsonaro.
Repercussão no Congresso
Deputados e senadores de oposição e de partidos de centro lançaram nessa quarta-feira (20) uma Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social. O grupo deve elaborar uma proposta de alteração das regras de aposentadoria que poderá ser discutida como alternativa à proposta do governo.
O deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP), membro da CCJC da Câmara, se pronunciou em uma rede social: “O que o governo mandou foi um plano de carreira para os militares e não um plano de reforma da previdência para os militares”, escreveu.
Orlando Silva (PCdoB/SP), deputado membro suplente da CCJC, publicou: “O problema da reforma não é ser um gatinho com os poderosos, mas ser um leão contra os pobres. O grande embate é derrotar a Reforma que tira tudo de quem já não tem quase nada”.
Em sua conta no Twitter, o deputado Túlio Gadêlha (PDT/PE) também atacou a proposta de reforma do governo Bolsonaro. “O presidente tenta convencer a população que a Reforma da Previdência será igual para todos. Pede sacrifício aos trabalhadores celetistas e servidores públicos, mas dá um jeito de aliviar para os militares. Essa Reforma de Bolsonaro não tem condições de passar”, concluiu.
Segundo o jornal Folha de São Paulo, a equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro calcula que, caso a reforma fosse levada a votação hoje, teria o apoio de cerca de 180 deputados. Para a aprovação de um projeto de emenda à Constituição, como é o caso da reforma da Previdência, são necessários 308 votos, ou seja, dois terços da legislatura.
Fonte: Brasil de Fato