Carta de Passo Fundo reafirma os princípios democráticos
A cidade de Passo Fundo promoveu ontem (05) uma série de debates sobre a Frente Brasil Popular, a Campanha Energia Educação e Indústria (Petróleo) e o Plano Camponês.
Os eventos aconteceram na sede do Sindicato dos Metalúrgicos, com a participação dos movimentos sociais, e na Faculdade de Direito do Campus da UPF, que recebeu atividades organizadas pelo Observatório da Democracia Brasileira / Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo. Ao final dos debates foi redigida a Carta de Passo Fundo.
CARTA DE PASSO FUNDO
As entidades abaixo nominadas, reunidas no Ato em defesa da Constituição de 1988 e do Estado Social e Democrático de Direito:
1. Reafirmam sua convicção de ser a democracia valor universal, em cujos marcos deve se desenvolver a luta política, respeitadas a pluralidade de ideias e a percepção do conflito como expressão própria desse espaço, decorrendo daí que o direito de reivindicar a realização do projeto emancipatório estabelecido pela Constituição da República situa-se no campo dos direitos de cidadania e, pois, é atividade legítima.
2. De outro lado, igualmente chamam a atenção e repudiam os diversos ataques e violações que a Constituição da República vem sofrendo nos últimos anos, seja por meio da apresentação e aprovação de emendas ao seu texto, que atingem frontalmente os direitos fundamentais, seja por intermédio da elaboração de leis que enfraquecem e desconsideram a impossibilidade de abolição dos referidos direitos, considerados cláusulas pétreas e formadores da identidade da nação.
3. Decorridos 27 anos de promulgação da Lei Maior, vivenciamos muitas dificuldades no acesso e gozo dos direitos econômicos e sociais, que buscam concretizar alguns dos objetivos previstos no artigo 4º da Constituição, como a erradicação da miséria e a diminuição das desigualdades sociais. Nessa medida, a flexibilização dos direitos trabalhistas, as reformas da previdência social, a Emenda Constitucional 86, que diminuiu o financiamento do SUS pelo Governo Federal e a PEC 451, que obriga empregadores a pagar planos privados de saúde aos empregadores, são exemplos dos movimentos políticos que objetivam enfraquecer o Sistema de bem estar social estabelecido na Constituição de 1988. Não fora isso, a proposta de alteração do regime de partilha na exploração dos poços do pré-sal que tramita no Senado Federal e o risco de privatização da PETROBRAS fragilizam sobremaneira o projeto de financiamento da saúde e da educação do povo brasileiro, retirando das futuras gerações a possibilidade de viverem num país onde essas exigências sejam efetivamente atendidas pela sociedade brasileira. Outrossim, apesar dos avanços obtidos pela execução dos programas e políticas públicas que melhoraram as condições de vida de uma parcela considerável da população brasileira, o momento atual revela inúmeras possibilidades de retrocesso , inclusive por um ajuste recessivo, monetário e fiscal, e pelas reformas liberais que avançam no Executivo e no Legislativo, ameaçando as melhorias distributivas e os avanços sociais dos últimos anos.
4. Para fazer frente a essa situação, sustentam a necessidade de aperfeiçoamento e qualificação da democracia brasileira, através de uma reforma política que efetivamente discuta a alteração dos processos decisórios, a forma do seu exercício, quem o exerce e quais os mecanismos de controle democrático no seu exercício, observando os princípios da igualdade, diversidade, justiça, liberdade, participação, transparência e controle social, porque apesar de imponente em alcance as reformas inauguradas após o regime autoritário, tiveram relativamente pouco impacto sobre a vida real daqueles que deveriam ter sido prioritariamente beneficiados por elas, na medida em que concentradas em delinear direitos, deixaram de promover mudanças na maquinaria democrática, permanecendo o controle político majoritariamente em mãos dos grupos tradicionalmente poderosos, os quais acabam bloqueando as reformas em matéria de direito e, neste momento, buscam ainda um retrocesso através de reformas constitucionais e infra-constitucionais que afetam diretamente direitos fundamentais.
5. Também sustentam a necessidade de – contra a ditadura do pensamento único, a exigir urgentemente a democratização dos meios de comunicação, e compreendendo o erro de diagnóstico da situação econômica brasileira – que os movimentos sociais e a sociedade brasileira se posicionem contrariamente ao ajuste monetário e fiscal proposto pelo governo, pois as medidas de austeridade cuja implantação vem sendo levada a cabo se amparam também na revisão – explícita ou implícita – das conquistas da Constituição, quando é fundamental aprofundar o enfrentamento da desigualdade de renda, patrimônio e oportunidades, fazendo o país voltar a crescer, através da flexibilização da política econômica baseada no tripé macroeconômico (metas de inflação, câmbio flutuante e metas de superávit primário). Impõe-se enfrentar a desigualdade em suas diversas faces, na renda, no trabalho, desigualdade tributária, na riqueza agrária, na riqueza urbana, na oferta e no acesso de bens e serviços públicos, como saúde e educação, buscando colocar a serviço desse projeto a consolidação da democracia, a reforma política e a macroeconomia, sendo fundamental manter as conquistas da Constituição de 1988, hoje ameaçadas pela onda conservadora no Legislativo.
6. Por isso, sustentam a necessidade do aprofundamento da democracia econômico-social, que se traduza no modelo de um Estado Social e Democrático de Direito e que evolua incessantemente para um Estado de Justiça baseado numa democracia radical, no qual seja tornada realidade a promessa constitucional de uma sociedade livre, justa e solidária, através do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e da redução das desigualdades sociais e regionais, promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, gênero, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.