Ato político dos 40 anos do MST reafirma a solidariedade como contraponto à crise do capital
Na quarta-feira (7), João Pedro Stédile estava feliz e emocionado. Rodeado por companheiros e companheiras das primeiras ocupações, de filhos e filhas da luta pela terra que vieram chegando ao longo dos últimos tempos e se somando aos quadros do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST). Também de autoridades municipais, estaduais e federais e aliados pertencentes aos mais diversos campos e a outros movimentos populares, fez um discurso repleto de força, mística, indignação e emoção no Ato de celebração dos 40 anos do MST no 20º Encontro Nacional.
“Se eu pudesse dizer só com uma palavra qual é a marca do MST eu diria que é a solidariedade. É a solidariedade como princípio de vida. Se não houvesse solidariedade como é que as pessoas chegariam lá na base para organizar outras? Pode demorar, mas depois que alcançarmos a reforma agrária, o MST vai se tornar o Movimento da Solidariedade dos Trabalhadores e Trabalhadoras Brasileiros.”
Estava em território simbólico para a história da luta pela reforma agrária no RS, a antiga Fazenda Annoni. Um local onde há 40 anos era um latifúndio improdutivo tomado por capim. Em 1985, 1.500 famílias realizaram uma das maiores e mais exitosas ocupações que se tem notícia. Hoje a fazenda é segmentada em uma série de assentamentos repletos de produção, vida e diversidade, contando com infraestrutura de educação, espaços de convívio social e cultura, estruturas de cooperação e organização da produção, agroindústrias e empreendimentos individuais e coletivos.
João Pedro se emocionou ao relembrar companheiros e companheiras de luta – foi as lágrimas ao citar os saudosos Zecão e Adão Pretto – e demonstrou gratidão com o aprendizado compartilhado por aqueles que precederam a luta do MST pela reforma agrária: Julião, líder das Ligas Camponesas que ensinou que o movimento precisa ser de massa, sem personalismos. Alexina Crespo que alertou para a importância do protagonismo das mulheres, que a luta deve ser travada lado a lado. Celso Furtado que indicou que as cooperativas seriam o caminho ideal para disputar a economia e os meios de produção com a burguesia. Exaltou as lideranças brizolistas, tão presentes naquela região, e relembrou a importância do movimento Master, que precedeu o MST na luta pela partilha da terra no RS.
“Nosso movimento foi construído pela classe trabalhadora. Por isso todos aqui são militantes do MST, independente de onde estejam atuando. A força do povo está na massa organizada, só a luta de massas traz mudanças. Sem luta de massas não há vitória.”
Ele lembrou que de 1979 a 1989 o Brasil viveu uma crise de grandes proporções. “Foi em meio a essa crise extrema do capitalismo, com fome, desemprego, que os trabalhadores coletivamente e em luta de classes construíram as organizações que estão aqui, todas elas são herdeiras daqueles dez anos. Foi dali que saíram a CUT, o PT, o MST e tantas outras, foi ali que vencemos a ditadura e ganhamos as Diretas Já.”
Crise do capitalismo, crise ambiental e crise política
Stédile afirma que hoje estamos vivendo um período parecido com o que vivemos entre 1979 e 1989, há uma crise estrutural do capitalismo. “O capitalismo não consegue mais resolver a produção para atender as necessidades da população. Os capitalistas continuam ricos e cada vez mais bilionários, mas o sistema que organiza a produção enfrenta essa contradição e não serve mais para a sociedade. O capitalismo está em crise estrutural e representa o sistema do passado, que não pode prometer mais nada para o futuro, por isso os capitalistas apelam para a barbárie.”
Segundo ele, ainda se soma à crise do capitalismo, a crise ambiental. “Nós percebemos através das mudanças climáticas. Calorão, tempestades, chuvas... O planeta corre risco. Por mais que o agronegócio esteja em festa, ganhando de novo, eles sabem que destroem a biodiversidade com os venenos e ajudam a desequilibrar o meio ambiente. Os capitalistas é que estão agredindo os povos indígenas na Amazônia, estão destruindo o cerrado, estão causando essas mudanças. O ser humano e a biodiversidade estão em risco no planeta Terra. E os capitalistas o que dizem? Nada. Ao contrário, querem vender o oxigênio das florestas como crédito de carbono.”
Para Stédile, o estado burguês não funciona mais. “Isso nos impõe a responsabilidade de repensar nossas organizações, repensar o trabalho de base, reorganizar as lutas de massa, destruir o capitalismo. Porque não haverá terra, alimentos, não haverá vida neste planeta se nós deixarmos o capitalismo funcionar. Os próximos 10 ou 20 anos será de muito mais luta, não será mais pela reforma agrária, será por uma sociedade igualitária, justa e sustentável.”
O ato dos 40 anos contou com a presença de amigos históricos do movimento, como o ex-governador Olívio Dutra, que viajou no ônibus junto com os representantes das cozinhas comunitárias, movimentos populares, sindicatos e partidos. Também participaram os deputados federais Dionilso Marcon e Reginete Bispo, o deputado estadual Adão Preto Filho representantes do senador Paulo Paim e da deputada federal Maria do Rosário, o presidente da CUT/RS, Amarildo Cenci, a juíza Ana Inês Algorta Latorre, representando a AJD (Associação dos Juízes pela Democracia). Além do superintendente do Ministério da Agricultura do RS, José Cleber, o presidente da Conab, Edegar Pretto, o superintendente do Incra no RS, Nelson Grasselli, e o prefeito de Pontão, Velton Hahn, e seu vice Deco.
Além das falas emocionadas, o ato foi marcado pela mística que acompanha o MST desde o seu nascimento. Também não faltaram o parabéns a você e um bolo para celebrar os 40 anos de muita luta e muitas conquistas.
Fonte: Brasil de Fato