A reindustrialização do Brasil como vacina para a crise econômica
Confira o texto escrito por Macrossetor de Indústria da CUT (MSI/CUT) e Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento/TID-Brasil
A pandemia mundial do novo coronavírus, a Covid-19, trouxe à luz algumas preocupações que ocupam a mente dos sindicalistas há pelo menos dez anos: a desindustrialização do Brasil.
A falta de incentivos para aumentar a competitividade da indústria nacional e sua crescente perda de relevância, com a substituição de vários elos das cadeias produtivas, em sua maioria, por produtos Made in China, têm custado ao País empregos de qualidade, renda, independência e soberania.
Em 2011, por conta dessa avalanche de importados, os metalúrgicos do ABC Paulista caminharam pela rodovia Anchieta para denunciar essa ameaça, que nos colocaria em uma situação de dependência cada vez mais difícil de ser revertida.
Países desenvolvidos e independentes têm indústria forte e potente, com condição de propor e criar tecnologia, com capacidade de inovação latente.
O desmonte da indústria brasileira foi responsável pela perda dessa capacidade de inovar, de desenvolver tecnologia, de entrar em novas tendências da chamada Indústria 4.0, da internet das coisas, do Big data, de softwares, da indústria eletrônica, da criação de novas matrizes energéticas e menos poluentes.
Isso abalou praticamente todos os segmentos da manufatura nacional, como é o caso da indústria têxtil, que na impossibilidade de disputar o mercado com a estratégia avassaladora do país oriental, começou a apresentar situações degradantes de seus trabalhadores e trabalhadoras, muitos em condições de trabalho análogas à escravidão.
A Covid-19 colocou em xeque a indústria nacional deste segmento, quando se constatou que 96% das máscaras de proteção, agora essenciais para se proteger do vírus letal, vinham da China e a indústria local não fabricava nenhum item sequer e para tanto teria que fazer uma reconversão de suas linhas de produção para dar conta da demanda urgente que estava colocada.
Outro ponto explicitado pela pandemia é a falta de insumos para testes de contaminação, o que tem atrasado em demasia os resultados para o coronavírus e dificultado o salvamento de vidas brasileiras. O que a indústria química pode nos dizer sobre isso ou o que a falta de incentivos para o desenvolvimento dela tem com isso?
O complexo de saúde é um dos pontos destacados pelo movimento sindical em seu Plano Indústria 10+ Desenvolvimento Produtivo e Tecnológico, conjunto de diretrizes que tem como objetivo aumentar a participação da indústria na geração de riqueza nacional, colaborando para melhorar a qualidade de vida, com a redução das desigualdades e a distribuição de renda da população nas diferentes regiões do Brasil.
Elaborado a partir de debates que reuniram mais de cem dirigentes dos sindicatos que compõem o Macrossetor da Indústria da CUT (metalúrgicos, químicos, vestuário, alimentação, construção civil e madeira e energéticos), o Plano propõe a promoção de setores estratégicos para avançar não só no novo paradigma tecnológico, mas também sobre os gargalos econômicos e sociais, como química de terceira geração, fármacos, biotecnologia, entre outros.
O que vivemos hoje é a amplificação deste debate para toda a sociedade daquilo que estamos lutando há anos e que ficou mais evidenciado, infelizmente, com o novo coronavírus.
Diante da iminência do colapso no setor de saúde no Brasil, a exemplo do que já vinha acontecendo em países europeus, como o caso da Itália, as montadoras Mercedes-Benz, General Motors, Ford, Scania, Toyota, Peugeot, Honda e a WEG (produtora de motores elétricos) reverteram, de forma quase que voluntária, algumas linhas de produção para a manutenção ou desenvolvimento de respiradores ou utilizando de suas impressoras 3D para confeccionar protetores faciais, que estão protegendo profissionais de saúde, do abastecimento e agentes funerários.
Hering e Guararapes, produtoras de roupas, firmaram acordo com governo do Rio Grande do Norte para a produção de 7 milhões de máscaras de pano por 78 oficinas e a Ambev, fabricante de cervejas no Rio de Janeiro, está produzindo 500 mil unidades de álcool em gel.
Segundo estudos da Subseção do Dieese no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, o BNDES criou o Programa de Apoio Emergencial ao Combate da Pandemia do Coronavírus, com recursos de R$ 2 bilhões para a ampliação de leitos hospitalares de UTI em 3 mil, respiradores pulmonares em 15 mil e monitores em 5 mil, que também pode financiar empresas para a reconversão produtiva.
Ainda pelo levantamento do Dieese, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, a Fapesp, lançou um edital especial de pesquisa e desenvolvimento na linha PIPE (pequenas empresas), no valor de R$ 20 milhões, para projetos de pesquisa em startups e em micro e pequenas empresas estabelecidas no Estado, que resultem em inovações tecnológicas voltadas ao combate da COVID-19 (kits diagnósticos, ventiladores, equipamentos de proteção, tecnologias digitais e inteligência artificial para os serviços de saúde).
Essas iniciativas - do setor privado com a conexão de políticas públicas de incentivo -, em um momento como esse em que a sociedade passa a compreender melhor o quanto é importante ter uma indústria articulada, têm que ser perenes, inicialmente por uma questão de saúde, mas que possa, futuramente, estruturar uma retomada do Brasil ao parque industrial do tamanho de um país como o nosso.
Além desses fatores e dessa oportunidade para o debate da indústria no Brasil, na outra mão da história nos deparamos com a indústria da alimentação, com as maiores empresas produtoras de proteína animal do mundo em solo nacional, mas por sua vez temos neste segmento o uso cada vez mais indiscriminado de agrotóxicos, que serão servidos à mesa do povo brasileiro.
Outra preocupação dos sindicalistas é o rumo concentrador de renda que a agroindústria tem imposto aos pequenos e médios produtores, que com menos incentivos públicos - principalmente no Programa de Aquisição de Alimentos (A verba do PAA em 2012 foi de R$ 1,2 bilhão. O previsto na Lei Orçamentária Anual 2020 é de R$ 101 milhões) -, têm se tornado reféns de uma política de preços que mal pagam os custos de suas produções, levando pobreza ao campo.
Temos as ferramentas, temos a indústria ainda presente, que nos dá capacidade de pensar em propor esse tipo de questão da reconversão em várias áreas, da sustentabilidade e da responsabilidade social e da preservação ambiental. Temos condições de fazer e é urgente que façamos.
Macrossetor de Indústria da CUT - MSI/CUT
Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento/TID-Brasil