O pulo da onça

João Guilherme Vargas Netto

Dizem que os grandes animais antediluvianos ao sofrerem uma ferida letal levavam um tempo enorme para morrer. Seu cérebro, minúsculo, era tardo em processar tal informação.

O movimento sindical dos trabalhadores brasileiros atravessa uma fase difícil em que a dessindicalização é galopante e há um retardo nas consciências para compreender o avassalador desafio que lhe é imposto e que não é de agora.

Depois de anos de globalização que destruiu as bases industriais, de uma recessão severa e renitente que eliminou milhões de empregos e dos efeitos desorganizadores da lei trabalhista celerada mal consegue se manter como movimento relevante, ainda que dirigentes e ativistas abnegados persistam na resistência e no esforço unitário.

Mas isto não basta se não levarmos em conta a necessária modificação da estratégia capaz de enfrentar e resolver os problemas novos criados pela vitória do bolsonarismo.

A tripartição das tarefas do ministério do Trabalho e sua extinção são o resumo do quadro de dificuldades criado para os trabalhadores formais, para o movimento sindical e para a negociação coletiva.

O bolsonarismo, que é consequência, em grande parte, de um estado de coisas socialmente desorganizado apresenta-se como o adversário mais consequente da ação sindical. Procura estrategicamente separar, com uma muralha da China verde e amarela, o núcleo organizado dos trabalhadores (em particular o próprio movimento sindical) da massa de milhões e fazer com que as instituições representativas entrem em colapso em suas expressões coletivas.

Para resistir a isto é preciso em primeiro lugar garantir a continuidade da existência de entidades sindicais de peso, de representatividade ainda incólume (afirmada em campanhas salariais efetivas e com resultados) e com capacidade de ação, uns 50 sindicatos de grandes categorias no Brasil inteiro.

Os dirigentes sindicais mais experientes e combativos devem se preocupar com esta nova etapa da luta e concentrar seus esforços nestes 50 pilares da resistência e da ressurgência do movimento, superando a fase da unidade de ação das cúpulas sem expressão equivalente nas bases.

Para preparar o pulo da onça é preciso ser onça.

João Guilherme Vargas Netto é consultor sindical de diversas entidades de trabalhadores em São Paulo

FTMRS